Hoje, deu vontade de chorar.
Por quê?
Tomo coragem para prosseguir e paro diante daquele lugar esquecido que todo mundo guarda no peito, como um velho sótão ou porão.
Há tantas histórias... Ali está uma bola, cascuda de atrito e vazia como o próprio tempo. Aqui, uma televisão amarela e rechonchuda, onde vilões eram maus e heróis eram bons, em intermináveis batalhas preto-e-branco. Na parede, empoeiram-se molduras diversas, ornadas de arabescos e elaboradas marchetarias. Em nenhuma há tela.
Deixo a fileira de espelhos ocos. Num canto escurecido e úmido, jaz uma grande escrivaninha, encerrando gavetas silenciosas como túmulos. Como um saqueador profano, violo o descanso de letras mortas: cadernos escolares, cartas de amor e rascunhos estranhos, ainda que familiares; parágrafos que não terminaram, poemas interrompidos.
Eu me afasto, querendo sair dali. A madeira do assoalho range sob meus pés, e por um momento tive a impressão de que o clangor se tornava maior a cada passo. Na maçaneta da porta, encaro meu reflexo invertido. A princípio, não me reconheço. No entanto, vou me acostumando àquela imagem, àquele rosto de ponta-cabeça que paulatinamente reivindica o seu dono. Sinto que isso tenha levado mais tempo do que deveria precisar.
Fecho a porta, mas não passo o trinco. A visita foi inútil.
Não pude descobrir de onde vêm as lágrimas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário