domingo, 13 de janeiro de 2013

Liga-desliga




O ano-novo veio – o mundo de 2012 acabou e eu me atrasei. Que janeiro ainda dê tempo de falar da singular situação que nós, human beings, abraçamos, sem talvez pensar ou perceber sem dar a devida importância. Refiro-me, é claro, à nossa tábua de salvação, ao socorro de todas as horas e à panacéia daquelas pequenas tragédias e comédias que compartilhamos nesta ordinária vida: o Liga-Desliga.

Amigo, a questão é a seguinte: Deu problema? Liga-Desliga.

Liga-Desliga serve pra tudo. Programa deu pau. Internet caiu. Carro não pegou. Antena não funcionou. Namorado brochou. O que você faz? Liga-Desliga.

A leitora perspicaz já percebe: Liga-Desliga é contradição em termos. O inverso é que é a realidade: primeiro você desliga alguma coisa e depois a religa. Misteriosamente, no entanto, a linguagem não se compromete com a ordem dos fatos. Fala-se Liga-e-Desliga e pronto. E todo mundo entende.

Quantas vezes essa sabedoria ancestral não resolveu sua vida? Lembra? Não funcionou de primeira, você tentou. Não funcionou de segunda, lá estava você, persistindo. Na décima tentativa, eis Liga-Desliga salvando sua pele. Inexplicavelmente.

Porque Liga-Desliga não funciona em bases racionais. Quem usou sabe. Sabe que não há sentido, não há nenhuma base científica ou razão que garanta 100 % que um método repetido da mesma forma e nas mesmas circunstâncias vá produzir resultado diferente. No entanto, produz. É absurdo. É nonsense. Ei, olhaí você tirando e recolocando o USB.

Digo mais: sem Liga-Desliga, a humanidade não teria chegado onde chegou.

Pense bem. Liga-Desliga é nossa resistência obstinada. A teimosia obtusa. A convicção obssessiva. O respeito humano ao sagrado e ao mistério.
Em 2013, que Liga-Desliga opere também em nossas vidas, nossas crenças antigas e valores há muito em suspeição. Tudo que não funcione bem, que opere mal, que a gente não goste na gente, resolva-se a partir do momento que você fizer em si mesmo o Liga-Desliga.

Porque Liga-Desliga é mais que ritual. É a fé que nos salva.


sexta-feira, 24 de agosto de 2012

A ágora

Os poucos parentes e amigos leitores devem ter constatado que o blog atravessa um hiato por vezes demasiado. A falta de atualização tem um nome: Facebook.

Pela sua própria concepção e estrutura, o FB dá de dez nos blogs em alguns quesitos. Ele funciona melhor como espaço de discussão e difusor de ideias. Mesmo com ferramentas singelas, o conteúdo postado tem um alcance muito maior, podendo ser aprovado de imediato - o que gera uma indicação mais ou menos fiel das preferências da galera.

É uma praça pública. É a ágora - não mais dos gregos, mas dos internautas de todos os países (reais ou fakes - não nos esqueçamos). O FB é  um virtual tribunal popular onde os oradores sobem em seus respectivos caixotes e discorrem about your issues. Onde cada um tem seu próprio círculo de espectadores para acompanhar a performance do artista andando sobre pregos ou rodopiando em transe numa dance street. Vê quem quer, prestigia quem gosta.

Como tudo, o que corta para o bem também corta para o mal. Nesse fio da navalha, na minha imodesta opinião, "o mal" está em duas perspectivas. Primeiro, a mais perigosa: o uso indiscriminado dos seus dados pessoais pelo próprio FB, CIA, etc. para atos de espionagem sabe-se lá para que fins - comerciais, políticos, persecutórios, caluniadores, etc. Segundo, o conteúdo que ora lhe alcança: do preconceito e xenofobia em último grau às brandas, porém ubíquas, mensagens religiosas de que alguém me ama e que eu não devo quebrar a corrente. Pelo amor de mim. 

No entanto, como bem me lembrou uma tia, no FB você só recebe as coisas que permite. O negócio é quando quem você bloqueou descobre e se chateia. Bem, ferir suscetibilidades é do jogo. Público ou não, o choro ainda é livre. 

Ainda que o blog tenha ficado meio relegado a segundo plano nos últimos tempos, Boêmios do Divã continua, à espera de boas ideias. Por outro lado, o perfil do blogueiro no Facebook está cada vez mais ativo. Uma hora o equilíbrio chega. Como dizem os gurus, a virtude está no meio - e não necessariamente nas mídias. 

sábado, 28 de julho de 2012

Vulto

Shakes era malandro. Em muitos sentidos. 

Ainda mais combinando "som" e "fúria". Esses vocábulos, que tanto fascinaram e a tantos, me intrigam também - embora não saiba exatamente por quê.

A vida é só um vulto, um pobre ator, que se pavoneia e choraminga num momento, sobre o palco, e depois não é mais ouvido. É uma fábula, contada por um idiota, cheia de som e de fúria, significando nada“.

Esse é o ponto. Toda vez que alguém diz "significa nada", cuidado.  


Significa tudo.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Furia jamás


Pra você ver que é possível mudar uma cultura.

Dá trabalho. Leva anos. Mas é possível.

A Espanha. Décadas e décadas regida por um epíteto fatal: "La Furia".

Ora, desde César sabemos que nome é destino. E o que vale para nomes, vale para apelidos. Repito: sobretudo para apelidos. Apodos flertam mais com a verdadeira essência das coisas que o próprio nome em si. São a versão adjetiva e substantiva dos cartuns e caricaturas. Entregam a autenticidade que a polidez impede ou polícia não permite.

De modo que nada atrapalhava mais a Espanha do que ter que ser "a Fúria". Era o tempo de Butrageño, o tempo de Michel. Por ter que incorporar, personificar, carregar o peso de ser uma Fúria, acabava por vias de fato sendo furiosa em tudo, do arremate do pênalti ao arremesso de um reles lateral. 


Eis o drama. Porque a fúria raramente é bem-vinda, compadres. Nos momentos decisivos, nos grandes momentos, o sujeito precisa de um mínimo de controle, um mínimo de nervos, um mililitro de sangue frio. O espanhol, não. Antes, parecia que esse direito jamais lhe assistiria. A Espanha então sucumbia, vergava sob a burra responsabilidade de agir eterna e copiosamente como "La Furia". Essa era a sensação. No futebol, esperava-se que os descendentes do Reino de Castela e Aragão se comportassem com a calmaria típica dos ciclopes epilépticos. Isso atrapalhava,  nas vitórias ou nas derrotas. Mais derrotas que vitórias, se lembrarmos bem.  


Aí está o que hoje é claro e cristalino: ao ser a Fúria em chuteiras, a Espanha se sabotava. Enganava sua índole, sua arte, suas tradições. Ao acreditar que eram onze centauros chucros num pasto, a pátria que pariu um Dali, um Picasso, um Cervantes, se perdia, se traía, se mutilava. Faltava sempre a têmpera necessária para reverter situações adversas e dominar as partidas.

Para azar e sorte do mundo, hoje não falta mais. Em algum momento, os espanhóis reencontraram sua legítima vocação. Que nunca foi ser o touro, a Fúria, mas sim quem a atiça e a aplaca: o toureiro. Uma verdade que sempre esteve debaixo de nossas ventas atônitas.

Tem algo mais parecido do que um pano vermelho agitado aquele uniforme escarlate, a hipnotizar o adversário com o toque-toque de bola? Tem algo mais parecido do que um touro os adversários a peleja inteira correndo atrás da bola, numa ânsia de chifres em busca da carne, sem porém jamais encontrá-la? Tem algo mais parecido do que uma tourada do que se apiedar do time adversário, esgotado por tanto marcar e marcar, com os bofes pra fora, ferido e esbaforido, extenuado como um quadrúpede de quatro patas (sim, porque há quadrúpedes com duas, que há de se fazer) ao fim do jogo? E, talvez por isso mesmo, muitas vezes nesse balé almiscarado você se pega torcendo mais para o touro do que para o toureiro? Porque lá estão novamente os espanhóis, no momentos derradeiros, cravando uma, duas, três, quatro cruéis estocadas no lombo - digo, nas redes - do pobre animal?


É assim, tem sido assim nos últimos anos. Tourada após tourada. No papel de matadores, os espanhóis não tem pressa, não se afobam, não tremem. Dançam na arena abraçados a sua verdadeira identidade. Por mais que o touro venha pra cima numa louca e furiosa carreira, eles agora mantêm a bola, a flâmula e a fleuma. São senhores do espetáculo. 


E dá-lhe olé.

sábado, 9 de junho de 2012

Ex-boêmio

Após semanas, finalmente uma boa noite de sono. Graças ao corticóide. O busílis é quando o remédio acabar... a crise de tosse é bruta.

Tenho ciência dos efeitos colaterais. Há mais de um mês que tenho tomado corticóide intermitentemente. O remédio preferido - cerveja - só em um único intervalo, semana passada.

Que ao menos essa bronquite que não me larga faça-me encurtar a cintura. Afinal de contas, as saladas têm ocupado um espaço crescente em meu prato. Preciso diminuir o nível de colesterol ruim. O bom tá acima da média.

Papinho de coroa, hein. A verdade, enfim, é outra. Na realidade, tenho medo de entrar precipitadamente à fase de saber nome e princípio ativo dos medicamentos de cor. Pior: de pular etapas no quesito presentes, estes sim, o verdadeiro termômetro etário da sua vida.

Porque o o envelhecimento do homem é medido pelo tipo de presentes que ganha. Senão, vejamos.

Você começa com bicos e chupetas. Carrinhos. Playmobil. Um cachorro. Depois, o mais importante presente da sua infância, uma bola. Videogame. Canivete suíço. Um carro, se os pais forem caridosos. Eletroeletrônicos. Roupas. Vinhos. Até aqui você é um sujeito ativo, esperto, boêmio. Então os presentes começam a decretar o início da sua obsolescência, o outono da sua juventude.

Nos últimos quatro anos, ganhei nada menos do que quatro pijamas. Tudo de gente que me quer bem: minha mulher, minha mamãe e minha sogrinha. Nada contra os presentes - até porque eram de muitíssima boa qualidade e não há como culpá-las de tentar erradicar-me o antigo hábito de dormir em andrajos - mas, de qualquer maneira, aquilo era um sinal claro, evidente de que algo não ia bem. Depois, foram as pantufas - ! - alerta máximo de que o camisolismo chegara. E, agora, me vejo na atual situação. Se bobear, atravesso incólume a fase das meias, gravatas e cachecóis para atingir triunfante, antes dos 40, a apoteose das pílulas e charopes, embrulhados talvez com lacinho e papel marchê.

Todavia, a idéia não é má. Não é má. Ainda mais com o preço que andam cobrando nas farmácias, os genéricos não são mais o que foram antigamente.

Pensando bem, nem os boêmios.






segunda-feira, 4 de junho de 2012

Mercantilizando tudo

Neste domingo, caminhando pela feira - que agora não sei se se chama Hippie ou "da Afonso Pena" - lembrei-me de um queixume comum das pessoas, há alguns anos. O de que, com a invasão de produtos industrializados e importados, a feira havia perdido sua identidade - o caráter de exposição de artes e artesanatos, da manufatura e do made in myself.

Ao longo da avenida, o grosso da feira é ocupado pelas barracas com produtos de fábrica. À margem desse feixe de barracas, os hippies de agora - descendentes dos verdadeiros criadores da Feira -  se esparramavam pelas calçadas laterais, expondo no chão seus badulaques, colares e pulseirinhas. Como rêmoras que sobrevivem aderidas em um grande tubarão.

O motor econômico se apropriou do significado original da feira e levou a tradição hippie para a periferia. Deveria ser o contrário. Por exemplo, a Feira de Santelmo, em Buenos Aires, parece conseguir resistir a essa descaracterização em marcha.

Na Feira da Afonso Pena, fiquei com a sensação de melancolia: os hippies se tornaram tão acessórios como os adereços que vendem.

* * *

Lembrei-me também dos jogos nos estádios de futebol, principalmente em partidas entre seleções, nas quais os preços dos ingressos não correspondem à realidade - tanto para o serviço oferecido no estádio quanto à condição socioeconômica dos frequentadores mais assíduos, o povão.

E, por fim, parei no festival Comida de Buteco em BH. O buteco era, não sei se ainda é, o refúgio da informalidade, de quem quer bater papo e tomar sua cervejinha sem frescura. Durante o festival, os bares ficam tão cheios quanto insuportáveis; e o evento de encerramento, uma megaprodução, com seguranças, shows, ingresso e estacionamento caros.

Tudo é pop. Tudo é mercantilizável.

* * *
Aliás, se você for parar, vai ver que a coisa às vezes é mais sutil do que se pensa. A linguagem, por exemplo.

Hoje, na sala de espera do consultório médico. Em uma revista Caras, o título de uma matéria surpreendeu: "Ator Fulano de Tal passeia com seus herdeiros".


Ou seja: a melhor qualificação que o editor encontrou para aquelas pessoinhas de cinco e três anos é a de que não eram "filhos" do ator - eram seus "herdeiros".


As relações de mercantilização contaminam os valores de tal forma que nem as manchetes escapam. Pensando bem, nem deveriam escapar, reflexo que são.

Bela herança.

quarta-feira, 30 de maio de 2012

sinusa brava

Sinusite brava, tosse macabra.
Noites maldormidas, trabalho em demasia.
O blog e o blogueiro, tal e qual, sofrem do mesmo mal.
Cheiro de mofo.



quarta-feira, 23 de maio de 2012

Grátis: declaração


Por que gosto da Meg.

A gente gosta de conhecimento.

A gente tem bom humor e sabe rir de si.

A gente caga e anda pra carro – uma funcionalidade, jamais uma ostentação.

A gente é carinhosa.

A gente gosta de planta, quintal e jardim.

A gente gosta de viajar.

A gente admira a inteligência alheia.

A gente gosta de bicho.

A gente normalmente acha uó as mesmas coisas. E as coisas que discordamos – ainda bem que existem – são acessórias, nunca essenciais.

A gente aprecia o prazer da boa mesa, sem medo de experimentar o novo (e ela ainda come de boca boa tudo o que faço).

A gente quer um dia morar em uma casa.

A gente acha que mais vale ser feliz hoje e amanhã também.

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Lady Códex

"A Livraria Quixote também já foi assaltada outras vezes: mais precisamente três, segundo Alencar Perdigão, dono da livraria. Na última, os bandidos arrombaram a porta de aço do estabelecimento e quebraram a de vidro. Eles levaram computador, garrafas de bebidas, aparelhos celulares e dinheiro – mas não tocaram nos livros. Alencar também reclama do pouco policiamento. “A rua fica vazia à noite e, depois das 19h, não tem policial por aqui”, reclama."


Notícia completa, aqui:http://www.nasavassi.com.br/bairro/em-uma-semana-ronaldo-fraga-e-livraria-quixote-sao-assaltadas-na-savassi/


E eu pensando na ironia. O que havia de mais valor deixaram para trás. Por essas e por outras que nunca tenho medo de deixar livro dentro do carro.


Se eu fosse ladrão, roubaria livros. E Meg também, suponho. Seríamos uma espécie de Bonnie e Clyde literários, pesadelo dos donos de livrarias e bibliotecas. 


Contudo, mesmo usando codinomes, seria fácil seguir nosso rastro. Inspetor da polícia civil e delegado na cena do crime:


- Eles atacaram novamente.
- Sim. Tudo leva a crer que se trata de mais um trabalho de Lady Códex e Kid Capa Dura. Veja - vários clássicos desapareceram dessas estantes.
- E a coleção de Paulo Coelho permanece intocada. 
- Não há dúvida, foram eles.


* * *
Se bem que, segundo registra a crônica familiar da minha patroa, o assalto de livros ocorre há tempos.


* * *


Falando em livros, preciso puxar o saco da minha queridíssima sogrinha. Agora não. Noutro momento, pois ainda trabalho - dentro da lei. 


Ainda. 

domingo, 13 de maio de 2012

Estraga-prazeres

Quando nas redes sociais vejo atleticanos vibrando, tirando sarro com torcedores rivais pela conquista do Campeonato Mineiro 2012, e o presidente do clube fala que a festa já está armada com trio elétrico (!) e que a massa vá às ruas, me sinto profundamente solitário. Profundamente solitário.

Deve ser uma estratégia traçada há anos, cumprida com sucesso risca a cada temporada. E, convenhamos.  Filosoficamente, não existe mal intrínseco em ser provinciano.

(Suspiro).




Gênio

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Entorpecido

Hoje, é mais que sabido. Paris me ama, Paris me quer, Paris me precisa.

No entanto, vejam vocês como são as coisas. Não se ignora que a beleza é fundamental, trovaria o poeta. Beleza põe a mesa, diriam os antigos. E, no que se refere à beleza, sabemos que Paris é caleidoscópica, opulenta, superior.

Aí é que está. Beleza demais também extenua.

Sim, porque, após tomar intermináveis choques estéticos e sinestésicos - em Paris não há beleza sem minúcia nem minúcia sem beleza - o amigo deve considerar a possibilidade de existir, nas entranhas do visitante incauto, uma certa nostalgia do simples, do comum, do trivial.

Aí, como acontece com quem come filé mignon todos os dias, bate uma saudade da carne moída.

Convenhamos, este é um mistério da condição humana. Verificável em qualquer época e lugar, mas que se acentua em Paris. De fato, nada parece ter escapado à obsessão de um povo que pingou gênio em todas as artes - música, arquitetura, literatura - e em todos os reinos - Vegetal, Animal, Mineral, Concreto e Abstrato ou, não duvide, Ectoplásmico. Aposto cabelos eriçados que até na categoria assombração a capital da França mostrar-se-á mais chique que as outras.

* * *


Place des Voges





Arcos da Place des Voges

Cometi essa longa digressão só para contar que, passeando na encantadoramente acolhedora Place de Voges, reputada como uma das belas da cidade das belas praças, fiquei desnorteado com as esculturas de uma galeria que se abriga nos arcos dos edifícios de entorno. Esculturas de Bruno Calatano, série "Os Viajantes", que agora compartilho com vocês. Esculpidas em tamanho natural, não se pareciam com nenhuma das dezenas de estátuas que havíamos visto até o momento. Eram diferentes, originais e instigantes. Surpreendentes.

Mas o mérito maior do artista, pra mim, foi outro: acordar uma vez mais o olhar que se acostumara, por virtude de uma cidade que deslumbra e entorpece, a ver a beleza como algo, assim, habitué.












Essaí dava pra ter lá em casa, hein, Meg? "Os viajantes".




terça-feira, 1 de maio de 2012

eureka

Nesse feriado prolongado, finalmente descobri o significado de tudo, o que devo fazer aqui na minha existência terrena, a vocação maior.

Vim nessa vida foi para ser aposentado. Na boa.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

O gancho



Tudo pelo Poder: recomendo. Ressentir-se-ão (opa, quequeisso) os mais habituados aos ritmos frenéticos de um blockbuster, mas pro bacana, aqui, que curte uma boa trama, o filme vem muito a contento - como quase tudo que Mr. Clooney se envolve.

O enredo trata das prévias do Partido Democrata, o embate entre dois pré-candidatos no, muitas vezes pesado, mas sempre astucioso, processo eleitoral. Vale tudo, principalmente golpe abaixo da cintura.

Meu chute é que, ao expor os intestinos do jogo político, os mesmos esquemas valem para qualquer país ou época. Basta trocar os atores. Por exemplo, eu podia jurar que vi o Michel Temer disfarçado ali.

No fundo, o filme acaba desmistificando a figura do político "santo", seja de direita ou de uma pretensa esquerda, convidando o telespéqui também a um cinismo salutar - serviço que presta a idealistas e ingênuos. George demonstra, uma vez mais, que é um cara engajado (deliberadamente se permitiu ser preso com o pai, para denunciarem uma situação de abuso internacional: google aí) e virimexe os filmes com que se envolve têm esse punch, essa pegada política forte.

Com Tudo pelo Poder, o bonitão continua em forma. E com um bom gancho, querendo ou não, de esquerda.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Memória fotográfica


"Entre 1888 e 1927, Eugène Atget fotografou Paris e seus arredores meticulosamente, capturando em milhares de fotografias parques da cidade, ruas, edifícios e seus habitantes."

Pois uma delas lembra muito nosso percurso diário no 13eme. Descíamos na estação de metrô da Place d´Italie, ir caminhando por uma avenida até o inicinho da Rue des Cinc Diamants.  Olhaí, amore. Nenão?




segunda-feira, 23 de abril de 2012

Delícia, delícia

Onde mais não sei, mas li um dia alguém observando que um gringo de passagem pelo Rio de Janeiro dificilmente encontraria butecos para experimentar ao vivo um show de bossa nova.

As músicas são as épocas - diria no facebook o Conselheiro Acácio.

E é pena, penso; pois, tendo o privilégio de poder viajar para o exterior, notar que os países valorizam suas distinções. Os traços culturais pelos quais se reconhecem e são reconhecidos, sejam a música, as artes, a arquitetura. Vá a Nova Iorque, decerto não lhe faltarão clubes de jazz; vá a Paris, estará lá o acordeon no metrô; vá a Buenos Aires, o tango redemoinha nas calles e casas do ramo.

E no Brasil? Cadê nossa bossa, nosso samba, nosso choro?

Percorrendo o interior da França num carro alugado, eis que, à parte um mundão de música francesa, toca o tal Michel Teló. Também no meio da Galeria Lafayette, na qual por um instante quase acreditei estar em pleno C&A do BH Shopping, onde jactanciosamente compro minhas bermudas baratas.

Aí é que está. Nada contra, ao contrário. Sem enrustir preconceito nenhum, não se trata de saudosismo. Esse mutatis mutandis musical é natural. Tudo o que hoje se entende como som mais genuinamente brasileiro, me parece, foi influenciado por gêneros musicais de outros reinos.

Em nossos quintais, se novas formas surgem - como funk, axé, forró "universitário" e suas respectivas subdivisões -, não vejo mal intrínseco nisso. Mas já chegou o tempo em que elas atingiram o paradigma de carteira de identidade de uma nação e só eu não estava ouvindo?

Porque, até onde entendo, esse apanágio ainda cabe ao samba, à bossa e ao choro. Aos tímpanos de todo o mundo, este ainda são, por enquanto, o nosso distintivo.

Penso, agora, na Copa do Mundo. Milhares de estrangeiros no Brasil. Onde vão ouvir um choro, senão em butecos da resistência? Sei que soa ingenuidade, mas quando imagino um clipe de futebol com imagens da seleção brasileira - outro ícone em decomposição - não me vem à cabeça "Delícia, delícia" - em que pesem as coreografias de gol em voga. Mas, sim, isto:


Taí. Minha esperança é um sujeito tipo Loco Abreu fazer três gols num domingo e pedir no Fantástico uma música do Pixinguinha.

A experiência


Desde que a atraente Buga preferiu esposar Ugh-Dois-Dentes a Kalu-Cabeça-de-Macaco, para desalento deste, numa tribo esquecida da nossa proto-civilização, sabe-se que nada é mais antigo e pessoal do que uma predileção estética. Bom ou mau, segundo os olhos de quem julga, gosto é e sempre foi gosto.

No belíssimo Museu d´Orsay, em Paris, já tínhamos visto o Louvre. Ou seja, obra de arte de tudo quanto há, de tudo quanto é lugar, época, etnia e estilo. Sem falar no palácio per se.

Mas o trem é que, na hora que vi as pinturas de Van Gogh, amigo - senti que estava diante de algo distinto. Pinceladas, cores. É bonito. Não sei explicar.

E sentir é o verbo. Senti que Van Gogh é diferente. Mas não consigo0 explicar nem entender por que é diferente. Não disponho de conhecimentos técnicos suficientes para convencer ninguém. E, no fim, sabemos, seria inútil. Pessoa pode olhar para obra-prima de Van Gogh, de imenso apuro estético, segundo os especialistas, e ficar indiferente, ao passo que - eu, hein - pode ter um transe apoplético diante de um sanitário de Duchamp. It´s really personal.

O fato é que, pra mim, depois do salão de Van Gogh, o resto do d´Orsay virou paisagem. Um luar de Paquetá, domo diria o Nelson.

Mas ainda havia muito mais para ver e sentir.

* * *
De um gênio para outro, aproveito o ensejo para lamentar - antes tarde do que mais tarde - publicamente a partida de nosso talvez maior intelectual brasileiro. Estávamos lá em Paris quando soubemos da morte do Millor Fernandes.

Gogh e Gogo: duas vidas que não foram em van.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Eu e a urubóloga, side by side

Ternurinha

Estudante universitário, tive o infortúnio de me sentar bem ao lado da urubóloga, numa reunião entre representantes de curso, professores e ela, convidada para palpitar (descer o cacete) sobre o estado de coisas da UFMG.

Era época de Paulo Renato, auge do sucateamento do ensino público, a fim de dar ensejo a futuras privatizações. Estado enxuto, etc, aquele ideário neolibelê de sempre.

Ela lá, falando que nossa universidade não prestava, que os cursos de comunicação eram deficientes (ah é,cê jura?), que isso, que aquilo era deplorável. Obviedades à parte, metendo o pau na gente (a faculdade vivia à míngua, com greves, sem recursos do governo FH - lembra a mudança na aposentadoria = professor doutor com anos de casa pedindo boné e professor substituto inexperiente entrando no lugar). Surpreendentemente, os professores lá, encantados, dizendo amém pra tudo que dona Miriam falava, como se fosse o próprio João Batista.

No mei daquele bando de baba-ovo, adivinha quem foi a única voz dissonante?

E, ao contextualizar, ainda fui chamado de anacrônico. Ou romântico, não sei bem.

Provavelmente porque o termo depreciativo "esquerdopata" não existia.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Organização criminosa fazendo jornalismo



Dá-lhe, Protógenes! Falou tudo, tudo o que há tempos tá entalado na garganta!