Vou caçar briga com você, mas para ser franco: La Dolce Vita é excessivamente longo. Se um dia não o foi; se hoje o planeta gira mais rápido; se os padrões atuais, o mundo moderno, a vida apressada, tudo exige velocidade - problema é nosso, não do clássico?
Aliás, clássico é. Certos méritos ninguém haverá de subtrair da grande película. Mas eu torço o nariz e me estrebucho toda vez que leio ou ouço um
devoto ser tão acrítico. É alucinatório como os próprios filmes de Fellini.
Para as Inteligências, é imaculado. Basta a menção da palavra Fellini e o sujeito começa a delirar, a virar os olhos para cima e a babar fisicamente, em êxtase.
Acredito mesmo que se deve respeitar o diretor e a obra pelos seus predicados; as virtudes cinematográficas; o caráter visionário; a crítica social irônica, nem sempre sutil; a influência que teve em legiões de admiradores, entre os mais ou menos ilustres.
Nesse ínterim, minha opinião pessoal carrega, obviamente, uma importância microbiótica. Ela só vale para mim, em termos íntimos, em termos de gosto. Mas sustento que achei La dolce vita assim-assim.
Uia, lá vêm pedradas.
Eu juro que me aventuro a passear pelos clássicos retendo firme minha rabugice na coleira; mantenho minha naturez rude e tosca sob curtas rédeas. Procuro, honestamente, ser pós-conceituoso.
Desconfio que se os beatos de Fellini entenderem que estou - minimamente que seja - a "falar mal" do filme, mesmo que me atenha somente ao filme, pronto: serei caçado a pauladas como uma ratazana prenha (ê, Nelson).
Já fui camundongo na faculdade. Já me decretaram morte social. Sei como é.
Porque a polícia das Inteligências, que costuma ser intolerante com qualquer crítica, advém sempre com um Mas. Digo: o filme é extenuante. Dirão: "Mas você tem que entender que o cinema europeu exige mais do telespectador, outra época, outros padrões". Digo: o filme é meio chato. Dirão: "Mas não é cinema comercial, é uma crítica contundente que antecipou todo o vazio da sociedade contemporânea, toda a espetacularização que veio depois". Digo: o filme poderia ser melhor editado. Dirão:"Mas você não compreende, Fellini é gênio, etc. etc.".
Fica a sensação de que gostam do filme menos pelo que ele é do que o que ele representa.
Ora, nenhuma crítica poderá diminuir o que significa A Doce Vida e seu diretor. Mas, depois de 178 minutos, confirmei uma verdade íntima do meu paladar:
Doce, quando é demais, enjoa.
PS. Isso não quer dizer que eu não esteja curtindo ficar menos inculto em cinema. Adoro essas sessões que compartilho com Meguinha. E, no fim, assistir a Dolce Vita produziu em mim uma sensação extraordinária: Fellini me fez sentir saudade de Bergman!