sexta-feira, 24 de agosto de 2012

A ágora

Os poucos parentes e amigos leitores devem ter constatado que o blog atravessa um hiato por vezes demasiado. A falta de atualização tem um nome: Facebook.

Pela sua própria concepção e estrutura, o FB dá de dez nos blogs em alguns quesitos. Ele funciona melhor como espaço de discussão e difusor de ideias. Mesmo com ferramentas singelas, o conteúdo postado tem um alcance muito maior, podendo ser aprovado de imediato - o que gera uma indicação mais ou menos fiel das preferências da galera.

É uma praça pública. É a ágora - não mais dos gregos, mas dos internautas de todos os países (reais ou fakes - não nos esqueçamos). O FB é  um virtual tribunal popular onde os oradores sobem em seus respectivos caixotes e discorrem about your issues. Onde cada um tem seu próprio círculo de espectadores para acompanhar a performance do artista andando sobre pregos ou rodopiando em transe numa dance street. Vê quem quer, prestigia quem gosta.

Como tudo, o que corta para o bem também corta para o mal. Nesse fio da navalha, na minha imodesta opinião, "o mal" está em duas perspectivas. Primeiro, a mais perigosa: o uso indiscriminado dos seus dados pessoais pelo próprio FB, CIA, etc. para atos de espionagem sabe-se lá para que fins - comerciais, políticos, persecutórios, caluniadores, etc. Segundo, o conteúdo que ora lhe alcança: do preconceito e xenofobia em último grau às brandas, porém ubíquas, mensagens religiosas de que alguém me ama e que eu não devo quebrar a corrente. Pelo amor de mim. 

No entanto, como bem me lembrou uma tia, no FB você só recebe as coisas que permite. O negócio é quando quem você bloqueou descobre e se chateia. Bem, ferir suscetibilidades é do jogo. Público ou não, o choro ainda é livre. 

Ainda que o blog tenha ficado meio relegado a segundo plano nos últimos tempos, Boêmios do Divã continua, à espera de boas ideias. Por outro lado, o perfil do blogueiro no Facebook está cada vez mais ativo. Uma hora o equilíbrio chega. Como dizem os gurus, a virtude está no meio - e não necessariamente nas mídias. 

sábado, 28 de julho de 2012

Vulto

Shakes era malandro. Em muitos sentidos. 

Ainda mais combinando "som" e "fúria". Esses vocábulos, que tanto fascinaram e a tantos, me intrigam também - embora não saiba exatamente por quê.

A vida é só um vulto, um pobre ator, que se pavoneia e choraminga num momento, sobre o palco, e depois não é mais ouvido. É uma fábula, contada por um idiota, cheia de som e de fúria, significando nada“.

Esse é o ponto. Toda vez que alguém diz "significa nada", cuidado.  


Significa tudo.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Furia jamás


Pra você ver que é possível mudar uma cultura.

Dá trabalho. Leva anos. Mas é possível.

A Espanha. Décadas e décadas regida por um epíteto fatal: "La Furia".

Ora, desde César sabemos que nome é destino. E o que vale para nomes, vale para apelidos. Repito: sobretudo para apelidos. Apodos flertam mais com a verdadeira essência das coisas que o próprio nome em si. São a versão adjetiva e substantiva dos cartuns e caricaturas. Entregam a autenticidade que a polidez impede ou polícia não permite.

De modo que nada atrapalhava mais a Espanha do que ter que ser "a Fúria". Era o tempo de Butrageño, o tempo de Michel. Por ter que incorporar, personificar, carregar o peso de ser uma Fúria, acabava por vias de fato sendo furiosa em tudo, do arremate do pênalti ao arremesso de um reles lateral. 


Eis o drama. Porque a fúria raramente é bem-vinda, compadres. Nos momentos decisivos, nos grandes momentos, o sujeito precisa de um mínimo de controle, um mínimo de nervos, um mililitro de sangue frio. O espanhol, não. Antes, parecia que esse direito jamais lhe assistiria. A Espanha então sucumbia, vergava sob a burra responsabilidade de agir eterna e copiosamente como "La Furia". Essa era a sensação. No futebol, esperava-se que os descendentes do Reino de Castela e Aragão se comportassem com a calmaria típica dos ciclopes epilépticos. Isso atrapalhava,  nas vitórias ou nas derrotas. Mais derrotas que vitórias, se lembrarmos bem.  


Aí está o que hoje é claro e cristalino: ao ser a Fúria em chuteiras, a Espanha se sabotava. Enganava sua índole, sua arte, suas tradições. Ao acreditar que eram onze centauros chucros num pasto, a pátria que pariu um Dali, um Picasso, um Cervantes, se perdia, se traía, se mutilava. Faltava sempre a têmpera necessária para reverter situações adversas e dominar as partidas.

Para azar e sorte do mundo, hoje não falta mais. Em algum momento, os espanhóis reencontraram sua legítima vocação. Que nunca foi ser o touro, a Fúria, mas sim quem a atiça e a aplaca: o toureiro. Uma verdade que sempre esteve debaixo de nossas ventas atônitas.

Tem algo mais parecido do que um pano vermelho agitado aquele uniforme escarlate, a hipnotizar o adversário com o toque-toque de bola? Tem algo mais parecido do que um touro os adversários a peleja inteira correndo atrás da bola, numa ânsia de chifres em busca da carne, sem porém jamais encontrá-la? Tem algo mais parecido do que uma tourada do que se apiedar do time adversário, esgotado por tanto marcar e marcar, com os bofes pra fora, ferido e esbaforido, extenuado como um quadrúpede de quatro patas (sim, porque há quadrúpedes com duas, que há de se fazer) ao fim do jogo? E, talvez por isso mesmo, muitas vezes nesse balé almiscarado você se pega torcendo mais para o touro do que para o toureiro? Porque lá estão novamente os espanhóis, no momentos derradeiros, cravando uma, duas, três, quatro cruéis estocadas no lombo - digo, nas redes - do pobre animal?


É assim, tem sido assim nos últimos anos. Tourada após tourada. No papel de matadores, os espanhóis não tem pressa, não se afobam, não tremem. Dançam na arena abraçados a sua verdadeira identidade. Por mais que o touro venha pra cima numa louca e furiosa carreira, eles agora mantêm a bola, a flâmula e a fleuma. São senhores do espetáculo. 


E dá-lhe olé.

sábado, 9 de junho de 2012

Ex-boêmio

Após semanas, finalmente uma boa noite de sono. Graças ao corticóide. O busílis é quando o remédio acabar... a crise de tosse é bruta.

Tenho ciência dos efeitos colaterais. Há mais de um mês que tenho tomado corticóide intermitentemente. O remédio preferido - cerveja - só em um único intervalo, semana passada.

Que ao menos essa bronquite que não me larga faça-me encurtar a cintura. Afinal de contas, as saladas têm ocupado um espaço crescente em meu prato. Preciso diminuir o nível de colesterol ruim. O bom tá acima da média.

Papinho de coroa, hein. A verdade, enfim, é outra. Na realidade, tenho medo de entrar precipitadamente à fase de saber nome e princípio ativo dos medicamentos de cor. Pior: de pular etapas no quesito presentes, estes sim, o verdadeiro termômetro etário da sua vida.

Porque o o envelhecimento do homem é medido pelo tipo de presentes que ganha. Senão, vejamos.

Você começa com bicos e chupetas. Carrinhos. Playmobil. Um cachorro. Depois, o mais importante presente da sua infância, uma bola. Videogame. Canivete suíço. Um carro, se os pais forem caridosos. Eletroeletrônicos. Roupas. Vinhos. Até aqui você é um sujeito ativo, esperto, boêmio. Então os presentes começam a decretar o início da sua obsolescência, o outono da sua juventude.

Nos últimos quatro anos, ganhei nada menos do que quatro pijamas. Tudo de gente que me quer bem: minha mulher, minha mamãe e minha sogrinha. Nada contra os presentes - até porque eram de muitíssima boa qualidade e não há como culpá-las de tentar erradicar-me o antigo hábito de dormir em andrajos - mas, de qualquer maneira, aquilo era um sinal claro, evidente de que algo não ia bem. Depois, foram as pantufas - ! - alerta máximo de que o camisolismo chegara. E, agora, me vejo na atual situação. Se bobear, atravesso incólume a fase das meias, gravatas e cachecóis para atingir triunfante, antes dos 40, a apoteose das pílulas e charopes, embrulhados talvez com lacinho e papel marchê.

Todavia, a idéia não é má. Não é má. Ainda mais com o preço que andam cobrando nas farmácias, os genéricos não são mais o que foram antigamente.

Pensando bem, nem os boêmios.






segunda-feira, 4 de junho de 2012

Mercantilizando tudo

Neste domingo, caminhando pela feira - que agora não sei se se chama Hippie ou "da Afonso Pena" - lembrei-me de um queixume comum das pessoas, há alguns anos. O de que, com a invasão de produtos industrializados e importados, a feira havia perdido sua identidade - o caráter de exposição de artes e artesanatos, da manufatura e do made in myself.

Ao longo da avenida, o grosso da feira é ocupado pelas barracas com produtos de fábrica. À margem desse feixe de barracas, os hippies de agora - descendentes dos verdadeiros criadores da Feira -  se esparramavam pelas calçadas laterais, expondo no chão seus badulaques, colares e pulseirinhas. Como rêmoras que sobrevivem aderidas em um grande tubarão.

O motor econômico se apropriou do significado original da feira e levou a tradição hippie para a periferia. Deveria ser o contrário. Por exemplo, a Feira de Santelmo, em Buenos Aires, parece conseguir resistir a essa descaracterização em marcha.

Na Feira da Afonso Pena, fiquei com a sensação de melancolia: os hippies se tornaram tão acessórios como os adereços que vendem.

* * *

Lembrei-me também dos jogos nos estádios de futebol, principalmente em partidas entre seleções, nas quais os preços dos ingressos não correspondem à realidade - tanto para o serviço oferecido no estádio quanto à condição socioeconômica dos frequentadores mais assíduos, o povão.

E, por fim, parei no festival Comida de Buteco em BH. O buteco era, não sei se ainda é, o refúgio da informalidade, de quem quer bater papo e tomar sua cervejinha sem frescura. Durante o festival, os bares ficam tão cheios quanto insuportáveis; e o evento de encerramento, uma megaprodução, com seguranças, shows, ingresso e estacionamento caros.

Tudo é pop. Tudo é mercantilizável.

* * *
Aliás, se você for parar, vai ver que a coisa às vezes é mais sutil do que se pensa. A linguagem, por exemplo.

Hoje, na sala de espera do consultório médico. Em uma revista Caras, o título de uma matéria surpreendeu: "Ator Fulano de Tal passeia com seus herdeiros".


Ou seja: a melhor qualificação que o editor encontrou para aquelas pessoinhas de cinco e três anos é a de que não eram "filhos" do ator - eram seus "herdeiros".


As relações de mercantilização contaminam os valores de tal forma que nem as manchetes escapam. Pensando bem, nem deveriam escapar, reflexo que são.

Bela herança.

quarta-feira, 30 de maio de 2012

sinusa brava

Sinusite brava, tosse macabra.
Noites maldormidas, trabalho em demasia.
O blog e o blogueiro, tal e qual, sofrem do mesmo mal.
Cheiro de mofo.



quarta-feira, 23 de maio de 2012

Grátis: declaração


Por que gosto da Meg.

A gente gosta de conhecimento.

A gente tem bom humor e sabe rir de si.

A gente caga e anda pra carro – uma funcionalidade, jamais uma ostentação.

A gente é carinhosa.

A gente gosta de planta, quintal e jardim.

A gente gosta de viajar.

A gente admira a inteligência alheia.

A gente gosta de bicho.

A gente normalmente acha uó as mesmas coisas. E as coisas que discordamos – ainda bem que existem – são acessórias, nunca essenciais.

A gente aprecia o prazer da boa mesa, sem medo de experimentar o novo (e ela ainda come de boca boa tudo o que faço).

A gente quer um dia morar em uma casa.

A gente acha que mais vale ser feliz hoje e amanhã também.

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Lady Códex

"A Livraria Quixote também já foi assaltada outras vezes: mais precisamente três, segundo Alencar Perdigão, dono da livraria. Na última, os bandidos arrombaram a porta de aço do estabelecimento e quebraram a de vidro. Eles levaram computador, garrafas de bebidas, aparelhos celulares e dinheiro – mas não tocaram nos livros. Alencar também reclama do pouco policiamento. “A rua fica vazia à noite e, depois das 19h, não tem policial por aqui”, reclama."


Notícia completa, aqui:http://www.nasavassi.com.br/bairro/em-uma-semana-ronaldo-fraga-e-livraria-quixote-sao-assaltadas-na-savassi/


E eu pensando na ironia. O que havia de mais valor deixaram para trás. Por essas e por outras que nunca tenho medo de deixar livro dentro do carro.


Se eu fosse ladrão, roubaria livros. E Meg também, suponho. Seríamos uma espécie de Bonnie e Clyde literários, pesadelo dos donos de livrarias e bibliotecas. 


Contudo, mesmo usando codinomes, seria fácil seguir nosso rastro. Inspetor da polícia civil e delegado na cena do crime:


- Eles atacaram novamente.
- Sim. Tudo leva a crer que se trata de mais um trabalho de Lady Códex e Kid Capa Dura. Veja - vários clássicos desapareceram dessas estantes.
- E a coleção de Paulo Coelho permanece intocada. 
- Não há dúvida, foram eles.


* * *
Se bem que, segundo registra a crônica familiar da minha patroa, o assalto de livros ocorre há tempos.


* * *


Falando em livros, preciso puxar o saco da minha queridíssima sogrinha. Agora não. Noutro momento, pois ainda trabalho - dentro da lei. 


Ainda. 

domingo, 13 de maio de 2012

Estraga-prazeres

Quando nas redes sociais vejo atleticanos vibrando, tirando sarro com torcedores rivais pela conquista do Campeonato Mineiro 2012, e o presidente do clube fala que a festa já está armada com trio elétrico (!) e que a massa vá às ruas, me sinto profundamente solitário. Profundamente solitário.

Deve ser uma estratégia traçada há anos, cumprida com sucesso risca a cada temporada. E, convenhamos.  Filosoficamente, não existe mal intrínseco em ser provinciano.

(Suspiro).




Gênio

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Entorpecido

Hoje, é mais que sabido. Paris me ama, Paris me quer, Paris me precisa.

No entanto, vejam vocês como são as coisas. Não se ignora que a beleza é fundamental, trovaria o poeta. Beleza põe a mesa, diriam os antigos. E, no que se refere à beleza, sabemos que Paris é caleidoscópica, opulenta, superior.

Aí é que está. Beleza demais também extenua.

Sim, porque, após tomar intermináveis choques estéticos e sinestésicos - em Paris não há beleza sem minúcia nem minúcia sem beleza - o amigo deve considerar a possibilidade de existir, nas entranhas do visitante incauto, uma certa nostalgia do simples, do comum, do trivial.

Aí, como acontece com quem come filé mignon todos os dias, bate uma saudade da carne moída.

Convenhamos, este é um mistério da condição humana. Verificável em qualquer época e lugar, mas que se acentua em Paris. De fato, nada parece ter escapado à obsessão de um povo que pingou gênio em todas as artes - música, arquitetura, literatura - e em todos os reinos - Vegetal, Animal, Mineral, Concreto e Abstrato ou, não duvide, Ectoplásmico. Aposto cabelos eriçados que até na categoria assombração a capital da França mostrar-se-á mais chique que as outras.

* * *


Place des Voges





Arcos da Place des Voges

Cometi essa longa digressão só para contar que, passeando na encantadoramente acolhedora Place de Voges, reputada como uma das belas da cidade das belas praças, fiquei desnorteado com as esculturas de uma galeria que se abriga nos arcos dos edifícios de entorno. Esculturas de Bruno Calatano, série "Os Viajantes", que agora compartilho com vocês. Esculpidas em tamanho natural, não se pareciam com nenhuma das dezenas de estátuas que havíamos visto até o momento. Eram diferentes, originais e instigantes. Surpreendentes.

Mas o mérito maior do artista, pra mim, foi outro: acordar uma vez mais o olhar que se acostumara, por virtude de uma cidade que deslumbra e entorpece, a ver a beleza como algo, assim, habitué.












Essaí dava pra ter lá em casa, hein, Meg? "Os viajantes".




terça-feira, 1 de maio de 2012

eureka

Nesse feriado prolongado, finalmente descobri o significado de tudo, o que devo fazer aqui na minha existência terrena, a vocação maior.

Vim nessa vida foi para ser aposentado. Na boa.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

O gancho



Tudo pelo Poder: recomendo. Ressentir-se-ão (opa, quequeisso) os mais habituados aos ritmos frenéticos de um blockbuster, mas pro bacana, aqui, que curte uma boa trama, o filme vem muito a contento - como quase tudo que Mr. Clooney se envolve.

O enredo trata das prévias do Partido Democrata, o embate entre dois pré-candidatos no, muitas vezes pesado, mas sempre astucioso, processo eleitoral. Vale tudo, principalmente golpe abaixo da cintura.

Meu chute é que, ao expor os intestinos do jogo político, os mesmos esquemas valem para qualquer país ou época. Basta trocar os atores. Por exemplo, eu podia jurar que vi o Michel Temer disfarçado ali.

No fundo, o filme acaba desmistificando a figura do político "santo", seja de direita ou de uma pretensa esquerda, convidando o telespéqui também a um cinismo salutar - serviço que presta a idealistas e ingênuos. George demonstra, uma vez mais, que é um cara engajado (deliberadamente se permitiu ser preso com o pai, para denunciarem uma situação de abuso internacional: google aí) e virimexe os filmes com que se envolve têm esse punch, essa pegada política forte.

Com Tudo pelo Poder, o bonitão continua em forma. E com um bom gancho, querendo ou não, de esquerda.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Memória fotográfica


"Entre 1888 e 1927, Eugène Atget fotografou Paris e seus arredores meticulosamente, capturando em milhares de fotografias parques da cidade, ruas, edifícios e seus habitantes."

Pois uma delas lembra muito nosso percurso diário no 13eme. Descíamos na estação de metrô da Place d´Italie, ir caminhando por uma avenida até o inicinho da Rue des Cinc Diamants.  Olhaí, amore. Nenão?




segunda-feira, 23 de abril de 2012

Delícia, delícia

Onde mais não sei, mas li um dia alguém observando que um gringo de passagem pelo Rio de Janeiro dificilmente encontraria butecos para experimentar ao vivo um show de bossa nova.

As músicas são as épocas - diria no facebook o Conselheiro Acácio.

E é pena, penso; pois, tendo o privilégio de poder viajar para o exterior, notar que os países valorizam suas distinções. Os traços culturais pelos quais se reconhecem e são reconhecidos, sejam a música, as artes, a arquitetura. Vá a Nova Iorque, decerto não lhe faltarão clubes de jazz; vá a Paris, estará lá o acordeon no metrô; vá a Buenos Aires, o tango redemoinha nas calles e casas do ramo.

E no Brasil? Cadê nossa bossa, nosso samba, nosso choro?

Percorrendo o interior da França num carro alugado, eis que, à parte um mundão de música francesa, toca o tal Michel Teló. Também no meio da Galeria Lafayette, na qual por um instante quase acreditei estar em pleno C&A do BH Shopping, onde jactanciosamente compro minhas bermudas baratas.

Aí é que está. Nada contra, ao contrário. Sem enrustir preconceito nenhum, não se trata de saudosismo. Esse mutatis mutandis musical é natural. Tudo o que hoje se entende como som mais genuinamente brasileiro, me parece, foi influenciado por gêneros musicais de outros reinos.

Em nossos quintais, se novas formas surgem - como funk, axé, forró "universitário" e suas respectivas subdivisões -, não vejo mal intrínseco nisso. Mas já chegou o tempo em que elas atingiram o paradigma de carteira de identidade de uma nação e só eu não estava ouvindo?

Porque, até onde entendo, esse apanágio ainda cabe ao samba, à bossa e ao choro. Aos tímpanos de todo o mundo, este ainda são, por enquanto, o nosso distintivo.

Penso, agora, na Copa do Mundo. Milhares de estrangeiros no Brasil. Onde vão ouvir um choro, senão em butecos da resistência? Sei que soa ingenuidade, mas quando imagino um clipe de futebol com imagens da seleção brasileira - outro ícone em decomposição - não me vem à cabeça "Delícia, delícia" - em que pesem as coreografias de gol em voga. Mas, sim, isto:


Taí. Minha esperança é um sujeito tipo Loco Abreu fazer três gols num domingo e pedir no Fantástico uma música do Pixinguinha.

A experiência


Desde que a atraente Buga preferiu esposar Ugh-Dois-Dentes a Kalu-Cabeça-de-Macaco, para desalento deste, numa tribo esquecida da nossa proto-civilização, sabe-se que nada é mais antigo e pessoal do que uma predileção estética. Bom ou mau, segundo os olhos de quem julga, gosto é e sempre foi gosto.

No belíssimo Museu d´Orsay, em Paris, já tínhamos visto o Louvre. Ou seja, obra de arte de tudo quanto há, de tudo quanto é lugar, época, etnia e estilo. Sem falar no palácio per se.

Mas o trem é que, na hora que vi as pinturas de Van Gogh, amigo - senti que estava diante de algo distinto. Pinceladas, cores. É bonito. Não sei explicar.

E sentir é o verbo. Senti que Van Gogh é diferente. Mas não consigo0 explicar nem entender por que é diferente. Não disponho de conhecimentos técnicos suficientes para convencer ninguém. E, no fim, sabemos, seria inútil. Pessoa pode olhar para obra-prima de Van Gogh, de imenso apuro estético, segundo os especialistas, e ficar indiferente, ao passo que - eu, hein - pode ter um transe apoplético diante de um sanitário de Duchamp. It´s really personal.

O fato é que, pra mim, depois do salão de Van Gogh, o resto do d´Orsay virou paisagem. Um luar de Paquetá, domo diria o Nelson.

Mas ainda havia muito mais para ver e sentir.

* * *
De um gênio para outro, aproveito o ensejo para lamentar - antes tarde do que mais tarde - publicamente a partida de nosso talvez maior intelectual brasileiro. Estávamos lá em Paris quando soubemos da morte do Millor Fernandes.

Gogh e Gogo: duas vidas que não foram em van.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Eu e a urubóloga, side by side

Ternurinha

Estudante universitário, tive o infortúnio de me sentar bem ao lado da urubóloga, numa reunião entre representantes de curso, professores e ela, convidada para palpitar (descer o cacete) sobre o estado de coisas da UFMG.

Era época de Paulo Renato, auge do sucateamento do ensino público, a fim de dar ensejo a futuras privatizações. Estado enxuto, etc, aquele ideário neolibelê de sempre.

Ela lá, falando que nossa universidade não prestava, que os cursos de comunicação eram deficientes (ah é,cê jura?), que isso, que aquilo era deplorável. Obviedades à parte, metendo o pau na gente (a faculdade vivia à míngua, com greves, sem recursos do governo FH - lembra a mudança na aposentadoria = professor doutor com anos de casa pedindo boné e professor substituto inexperiente entrando no lugar). Surpreendentemente, os professores lá, encantados, dizendo amém pra tudo que dona Miriam falava, como se fosse o próprio João Batista.

No mei daquele bando de baba-ovo, adivinha quem foi a única voz dissonante?

E, ao contextualizar, ainda fui chamado de anacrônico. Ou romântico, não sei bem.

Provavelmente porque o termo depreciativo "esquerdopata" não existia.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Organização criminosa fazendo jornalismo



Dá-lhe, Protógenes! Falou tudo, tudo o que há tempos tá entalado na garganta!

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Inconsolável Paris

Paris me ama.

Senti isso desde que me viu pela primeira vez.

O que provocou tal paixão? O que Paris terá visto em mim? Nem eu mesmo sei. Meu palpite é que nem todos nessa vida têm a boa estrela de nascer em Teófilo Otoni.

O fato, amigos, o fato é o seguinte. Paris tentou me seduzir de todas as maneiras, fez uso de seu arsenal desde o primeiro instante. Era um encanto a cada 8 minutos, uma surpresa a cada quartier, apresentando-se sempre magnífica, sempre estonteante. Superlativa e caleidoscópicamente bela em todos os sentidos: museus, catedrais, parques, ruas, bistrôs... como bem disse Meguinha, um buquê de sensações.

Bem, aí sucedeu-se todo o imbróglio da viagem. Paris não lidou bem o fato de eu já ser um homem casado. Exigiu exclusividade. Como havia feito com Hemingway, Picasso e a tantos outros, me queria prostrado a seus pés.

- Impossível, eu disse. Amo minha mulher. E lembra de onde eu vim? Nós, teofilotonenses, somos durões.

Aí - como sói ocorrer com o humor das divas acostumadas a ter todos os caprichos satisfeitos - fechou o tempo.

A relação esfriou, com dias de baixas temperaturas. Pelas manhãs, dava-me tapas de vento na cara.

Mas de nada adiantava. Perdidinha por mim, Paris não deixou de verter suas lágrimas, obrigando-me inclusive a adquirir um guarda-chuva.

Por fim, ao ver que seus esforços eram inúteis, aceitou os fatos com alguma resignação. Então seu semblante desanuviou-se. Fez-se no céu um azul de Giotto; nos jardins, flores se abriram; nos parques, o sol brilhou sobre a verde pelúcia.

Já no aeroporto, prestes a embarcar de volta à minha vida nos trópicos do hemisfério sul, travamos nosso derradeiro diálogo:

- E nós, Rubão?

- Não.

- Fique, eu imploro. O que vai ser da minha vida sem você?

- Você vai sobreviver.

- É assim? Tudo acabou?

- No fundo, nós dois sabemos que eu tenho que pegar aquele voo com a Meg.

- Vamos nos ver novamente algum dia?

- Não sei, Paris. Mas talvez este seja o começo de uma bela amizade.

Entrei no avião sem olhar pra trás.

segunda-feira, 26 de março de 2012

Le jour de gloire est arrive

Mes ami,

Vamo ali e já vortemo. Beijos,

A bientôt,

r

quarta-feira, 21 de março de 2012

Possessão

Segunda ou terceira vez que sonho que estava sendo possuído. Brrr! É uma sensação terrível. Real e assustador.

Hoje, no ápice do sonho, tentando encontrar um meio de me salvar da dominação completa e irremediável por um espírito maligno, lancei-me desesperado à busca um mantra ou prece de proteção.

O detalhe é que, no sonho, em vez de bater o joelho no chão e rezar um Pai Nosso ou a Ave Maria, comecei a cantar Chico Buarque.

Por favor, não me excomungue. Pois a fé de cada um não é conforme os ídolos e deuses que venera?

Enfim. Pai, afasta de mim este cálice!


PS: encaro o assunto científica e agnosticamente.


Operação França II


Gente, gente. Segurem a onda docês aí que nós tamo chegando.

* * *

Em Paris, vamos ficar no 13º distrito, Gobelins, a algumas quadras da barulhenta Place d´Italie. Não figura como destino mais procurado pelos turistas, nem é tão próximo às atrações mais manjadas - o que permitiria a você alcançá-las num passeio a pé-, mas, por outro lado, está longe de ser um lugar sem atrativos.


Lá é o principal reduto asiático de Paris, com restaurantes tailandeses, japoneses e chineses (com variações, segundo li, cozinha chinesa típica do Cantão, do Centrão e do Cantinho, sei lá). No entanto, não é exatamente por ali que nós hospedaremos.

Cercado de prédios mais modernos, a salvo porém da urbanização e frenesi automobilístico parisiense, ergue-se no coração do 13eme o Butte Aux Caille, uma espécie de petit village com casas antigas e jardins, pequenos edifícios, muros decorados com street art, ruas e vielas calçadas de pedra. Uma zona boêmia, como dizem os gauleses, charmante et pittoresque.
Salvo engano, pronuncia-se algo como "Butô-cái". Com biquinho.

Butte, para nós que num falemo francé, means colina

Nosso mundinho por três semanas


Ali ficaremos em um istudiô na rua que tem o mesmo nome do bairro. Dizem que o quartier é muito frequentado por universitários. Por perto, entre outras coisas, há vários restaurantes e bistrôs, como aquele localizado no número 5 da evocativa Rue chamada "Cinq Diamants", o basco Chez Gladines (se lá transmitir, adivinha onde vou querer assistir Barcelona x Milan pelas quartas de final da Champions League dia 28 de março?);

Pelo que vi dos pratos no link acima, vai dar vontade
de reservar um pra cada noite. Vai lá pucevê se dá pra evitar não voltar panhoca.


Piscinão de Ramos - versão Paris

Também nos arredores se encontram a primeira piscina pública da capital, e, bem do ladim da gente, uma pracinha em homenagem à Comuna de Paris - ó minha vocação revolucionária me chamando!

"Contre nous de la tyrannie..."

Pracinha em homenagem à Comuna de Paris; acho que nosso cafofo é logo ali, dobrando a esquina.


Sala, quarto e cozinha : tudo ao mesmo tempo agora

L´armoire = le lit! Bon Dieu!

terça-feira, 20 de março de 2012

Tem como não gostar desse cabra?


Só pra lembrar com alegria que - no dia em que Messi alcança o topo da artilharia na história do clube -  somos contemporâneos.

Pra quem gosta de futebol, nada é melhor do que vê-lo jogar.

O cara ainda vai estar lá, à frente do Garrincha, à frente do Maradona e atrás do negão.

Escreve aí.

segunda-feira, 19 de março de 2012

Operação França

Entramos na semana derradeira para a viagem. Com muito menos pesquisa do que eu pessoalmente gostaria, em função de contratempos.

Por exemplo: comprei livros de idiomas para tartamudear em francês - mas não dará tempo de ler nem treinar.

Tampouco pude detalhar com a profundidade necessária os passeios, os programas com descontos, a logística de cada um.

Fazer o quê. "Joie!", me diz o Tradutor. Allez, Rubón e Meguí.






sexta-feira, 16 de março de 2012

A reinvenção em uma pequena parábola

Tudo leva a crer que três dimensões que cumprem uma interseção na minha vida - as esferas profissional, pessoal e social - chegaram, concomitantemente, a um ponto de inflexão.

Talvez seja preciso agora abandonar ideias que envelheceram. Aceitar que sonhos entram em obsolescência. Deixar que paradigmas se decomponham em paz.

A vida não tem sentido. Mas a busca por um sentido na vida é o que dá sentido à minha.

E o que dá sentido na vida da gente é o outro. Inevitavelmente.

Por isso, é confortável - não, confortável, não; é muito, muito mais que isso - poder contar com a esposa querida e familiares.

Porque, de resto, em cada uma daquelas esferas, sempre haverá de ter uma solidão tangente.

quinta-feira, 15 de março de 2012

Loucos de Bilbao

O Barça não vai ter vida fácil com o Athletic de Bilbao, não.

O time do visionário - às vezes ridicularizado - Louco Bielsa parece estar com uma energia irresistível.

Vejemo.

Ei, Bielsa. Vem treinar o Galo.

Sobre a infrequência

Disse uma vez Eduardo Galeano:

Quando as palvras não são tão dignas quanto o silêncio, é melhor calar e esperar.

quarta-feira, 14 de março de 2012

Pensando Educação, parte III

Olha que revolução a Finlândia está fazendo. Tudo diferente do que Brasil, EUA, Austrália e sei lá mais quem vê, (des)organiza e des(trata) a educação. Quase dá vontade de ser finlandês.




De maneira geral, o assunto educação me preocupa. Porque creio que nossa sociedade está criando uma geração de 140 caracteres sem se ocupar plenamente da formação de um único caráter.


segunda-feira, 12 de março de 2012

Tempos tristes

Ricardo Teixeira deixa a CBF. Tinha tudo para ser um dia histórico.

Mas, de repente, ninguém tem muito por que comemorar.


* * *

Bem, amigos da Rádio Boêmios no Divã. O o ouvinte que vos escreve dedica a próxima canção à sua esposa, Dra. Meg Marques.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Pirando

Pesquisa indica que o paulistano tá ficando doido, premido entre a depressão e a ansiedade.

Há anos prevejo que isso seria uma forte contingência a atingir o ser urbano. O cara comum, working or middle class, nos seus variados matizes.

BH vai pelo mesmo caminho.

Sujeito não pode beber, não pode fumar, não pode trepar. Não pode nada. Massacrado e reprimido de tudo quanto é lado e jeito. Perdido numa sociedade economicamente preconceituosa, altamente consumista, profundamente superficial. Com cada vez menos opções acessíveis de lazer e diversão. De cultura. De esporte. De arte. De fantasia.

Acham que isso daria o quê? Uma fábrica de maníacos ou uma usina de poetas?

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Carná na terra de Chatô

João Pessoa é boa cidade; no Brasil, tem a costa mais oriental. Chove todo dia, mas tem sol, calor e sal. Bem quente e muito úmida - o que, no Nordeste, é normal. Não tem carnaval; suas festividades e blocos ocorrem nas vésperas, desde uma semana antes da data oficial. Deve ser pra evitar disputa com Recife, Olinda e Natal. Vixe! Rimou tudo e olhe que nem sou repentista e tal!

* * *

Adorei Rubacão, mistureba em que vai feijão verde, arroz, creme de leite (acho), queijo e um ingrediente protéico à escolha: ou camarão ou carne de sol/charque/lingüiça/frango. O nome do prato típico parece o pseudônimo de um mascote que eu teria, caso fosse um super-herói em um seriado ou desenho animado dos anos sessenta. "Ariel! Rubacão! Ukla! Vaaamos!"

Faltou achar um ensopadinho de lagosta pra sorver e um goiamum pra destrinchar. Estava em falta na maioria dos quiosques e restaurantes. Ficamos com a impressão de entressafra.

* * *

No comércio, mais de uma pessoa me perguntou se eu era nativo. Legal. Me deu ganas de engatar um sotaque arretado, pra ver se passava mesmo como um local sem ser desmascarado. Mas acabei deixando a ideia pra lá.

* * *

Passeio em Picãozinho, piscinas de água transparente longe da costa. Não vale a pena. Barcos em excesso, gente em demasia. A água acaba ficando turva e não tem espaço pra se locomover porque não se deve pisar nos corais. Só que a quantidade de turistas acaba estimulando a transgressão.

Praia do Sol, ao sul de JP. Vale conhecer, o esqueminha que eu gosto. Gente pouca, praia ampla, quiosquinho com mesa na areia para ficar ali. Só não pude tomar uma gelada porque dirigia.

Praia Bela, encontro mar e rio e mesas n'água. Os indefectíveis carros com porta-mala aberto e o som das profundezas do Hades. Dispenso.

Coqueirinho. Mesmo esquema descrito acima, mas é mais bonita, a meu ver. Mas é melhor que a Praia Bela, pois tem um restaurante onde dá pra se isolar um pouco do furdunço.

Ponta do Seixas. Interessante, do alto da falésia, ótima vista do mar. E o museu do Niemayer, ali do lado, vale ir só pra não dizer que tu não foi.

Centro histórico tá precisando de um capricho. Quase tudo em estado de abandono. E, quando fomos, na terça, tava tudo fechado. Pena.

* * *

Na ida, conexão no Rio, eis que surge uma mulher com um derriere inversamente proporcional ao tamanho do seu vestido. Era a tal Nicole Bahls - uma das celebundas mais em voga, atualmente.

* * *

Talvez o ponto máximo desse carnaval na Paraíba tenha sido Tambaba. Quem conhece a praia sabe o que significa.

Mas é matéria para outro post, talvez intitulado: "Sem frescura, sem disfarce, sem fantasia".

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Vô ali

Conhecer a Paraíba.

De carnaval para carnificina (socioeconômica): e a Grécia, hein?

Fico até pensando se não é a sacanagem dos caras: vamos matar o berço da cultura ocidental, primeiro.

Se não é deliberada, é de uma ironia crudelíssima.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Kolam


Em minhas fuçadas aleatórias, descobri o Kolam. Lesgal. Segundo li,


é um tipo de figura complexa e elaborada desenhada com pó-de-arroz oupó-de-pedra, na entrada das casas no Estado de Tamil Nadu, no sudeste da Índia. O desenho, feito com habilidade, graça e destreza, é feito pelas mulheres do vilarejo, emuma tradição cultural passada de mãe para filha desde o século III ou IV a.C.


Dia dos Namorados

Agora, recebo email de uma loja de departamentos para aproveitar as promoções de hoje, Valentine´s Day.

É uma sequência do Halloween, que já existe aqui. Rolo compressor natural ou subserviência cultural desmedida?

Aposto uma paçoquinha que ainda receberei este ano um email das Lojas Americanas sobre as pechinchas do Dia de Ação de Graças.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Se arrependimento matasse

Enfermeira catalogou os arrependimentos de quem esteve na iminência de bater o cartão de ponto. Leia, que você não vai se arrepender.



Da Folha.com

Veja os cinco maiores arrependimentos daqueles que estão para morrer

Uma enfermeira que aconselhou muitas pessoas em seus últimos dias de vida escreveu um livro com os cinco arrependimentos mais comuns das pessoas antes de morrer.

Bronnie Ware é um enfermeira que passou muitos anos trabalhando com cuidados paliativos, cuidando de pacientes em seus últimos três meses de vida. Em "The Top Five Regrets of the Dying" (Top Cinco Arrependimentos Daqueles que Estão Para Morrer", ela conta que os pacientes ganharam uma clareza de pensamento incrível no fim de suas vidas e que podemos aprender muito desta sabedoria.

"Quando questionados sobre desejos e arrependimentos, alguns temas comuns surgiam repetidamente", disse Bronnie ao jornal britânico "The Guardian".

Confira a lista e os comentários da enfermeira:

p>1. Eu gostaria de ter tido a coragem de viver a vida que eu quisesse, não a vida que os outros esperavam que eu vivesse

"Esse foi o arrependimento mais comum. Quando as pessoas percebem que a vida delas está quase no fim e olham para trás, é fácil ver quantos sonhos não foram realizados. A maioria das pessoas não realizou nem metade dos seus sonhos e têm de morrer sabendo que isso aconteceu por causa de decisões que tomaram, ou não tomaram. A saúde traz uma liberdade que poucos conseguem perceber, até que eles não a têm mais."

2. Eu gostaria de não ter trabalhado tanto

"Eu ouvi isso de todo paciente masculino que eu trabalhei. Eles sentiam falta de ter vivido mais a juventude dos filhos e a companhia de seus parceiros. As mulheres também falaram desse arrependimento, mas como a maioria era de uma geração mais antiga, muitas não tiveram uma carreira. Todos os homens com quem eu conversei se arrependeram de passar tanto tempo de suas vidas no ambiente de trabalho."

3. Eu queria ter tido a coragem de expressar meus sentimentos

"Muitas pessoas suprimiram seus sentimentos para ficar em paz com os outros. Como resultado, eles se acomodaram em uma existência medíocre e nunca se tornaram quem eles realmente eram capazes de ser. Muitos desenvolveram doenças relacionadas à amargura e ressentimento que eles carregavam."

4. Eu gostaria de ter ficado em contato com os meus amigos

"Frequentemente eles não percebiam as vantagens de ter velhos amigos até eles chegarem em suas últimas semanas de vida e não era sempre possível rastrear essas pessoas. Muitos ficaram tão envolvidos em suas próprias vidas que eles deixaram amizades de ouro se perderem ao longo dos anos. Tiveram muito arrependimentos profundos sobre não ter dedicado tempo e esforço às amizades. Todo mundo sente falta dos amigos quando está morrendo."

5. Eu gostaria de ter me permitido ser mais feliz

"Esse é um arrependimento surpreendentemente comum. Muitos só percebem isso no fim da vida que a felicidade é uma escolha. As pessoas ficam presas em antigos hábitos e padrões. O famoso 'conforto' com as coisas que são familiares O medo da mudança fez com que ele fingissem para os outros e para si mesmos que eles estavam contentes quando, no fundo, eles ansiavam por rir de verdade e aproveitar as coisas bobas em suas vidas de novo."






quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Sapere aude*



Parte II de um post aí pra trás, espremendo um cadim dilemas da educação , tutelato, etc. Ao ataque, pois!

Na Idade Média, a busca pela formação do homem livre era inspirada na clássica educação greco-romana, desvinculada de preocupações mundanas ou laborais.

Estruturou-se, nas primeiras universidades, nos mosteiros e catedrais – algo aí em torno do século IX – uma metodologia de ensino baseada em sete artes denominadas liberais. Dividiam-se em dois conjuntos: Trivium (encontro de três vias) e Quadrivium.

Trivium era composta por gramática, dialética e retórica. Reproduzindo aqui informação de segunda mão, de acordo com um teólogo da época, “a Gramática é o conhecimento de como falar sem cometer erro [gramática não no sentido como a entendemos hoje, mas sim no propósito de ensinar a clareza de expressão e comunicação de ideias]; a Dialética é a discussão perspicaz e solidamente argumentada por meio da qual o verdadeiro se separa do falso; e a Retórica é a disciplina da persuasão para toda e qualquer coisa apropriada e conveniente”. Trivial e elementar, meu caro. Aí está a base.

O sujeito podia parar por aqui e professar sacerdócio ou função administrativa eclesiástica. Ou, então, partir para o Quadrivium e continuar o edifício da sua instrução.

Aritmética, geometria, astronomia e música compunham o Quadrivium. O objetivo destas artes era a providência dos meios e dos métodos para o estudo da matéria e das coisas, pavimentando o caminho para seguir adiante. E, após o quê, era possível ao compadre se especializar em alguma das disciplinas superiores em voga na época: direito, medicina, teologia avançada.

Estas, como foi sublinhado, eram as artes liberais. A aprendizagem de profissões do tipo artesanal, como construção civil (ó a maçonariaí, gente!), se circunscreviam a corporações de ofícios, guildas e grêmios, creio.




Qual a boa ideia por trás da didática do Trivium, Quadrivium ?

Bom, o bichim tinha que aprender primeiro o domínio da linguagem – principal, mais básica ferramenta humana de interpretação e intermediação com o mundo – e as sutilezas, desdobramentos e complexidades decorrentes da sua aplicação, a partir do estudo de . Trocando em miúdos: primeiro, aprender a raciocinar. Depois, no Quadrivium, percorrem-se as disciplinas de cálculo, espaciais, “numéricas”, “de “quantidade”, que lhe permitiriam uma aplicação mais prática na sequência, útil ou imprescindível a determinados ofícios.

E o que toda essa salada tem a ver com o ensino de hoje?

O trecho que encontrei, num blog que me pareceu meio conservador, consegue traçar uma síntese lúcida e precisa da questão:

“O enigma da baixíssima eficiência do ensino, que não é fenômeno exclusivamente brasileiro, foi em parte resolvido na década de setenta pelo padre austríaco Ivan Illich (1926-2002), que propôs a sociedade sem escolas “tout court”. A tese de Illich, cujo mérito avulta na proporção direta do fracasso educacional geral, é que o sistema de ensino não tem por objetivo realmente educar, mas somente distribuir socialmente os indivíduos, por meio do ritual de certificados e diplomas. A escola formal, esta que Illich deseja suprimir, não é um meio de educação, mas um meio de “promoção” social, fato que as pessoas humildes revelam perceber quando insistem com o Joãozinho: estude, meu filho, estude...

Como se vê, vamos decifrando o mistério à medida que desprezamos a falsa equação entre ensino e educação. O sistema de ensino não produz educação, porque está ocupado demais em produzir documentos. Educação terá de ser buscada preferencialmente alhures, fora do sistema. É claro, sempre haverá um professor ou outro que, valendo-se da apatia do sistema, dará, por sua própria conta, aulas magistrais e educará de fato, contanto que seus alunos o desejem – o que, obviamente, nem sempre é o caso.

Temos aí uma espécie de lei geral com correlação inversa: a capacidade de educar alguém é inversamente proporcional à oficialidade do ato e diretamente proporcional à liberdade de adesão do educando. A educação prospera mais quando se a procura livremente. Este é o sentido da palavra “liberal” (de liber, livre) nas Sete Artes “liberais” da idade média, que eram ensinadas ao homem livre, por oposição às artes “iliberais”, ensinadas ao homem “preso”, controlado por guildas. Estas corporações de ofícios faziam grosseiramente o papel do sistema de ensino moderno, regulando privilégios econômicos e sociais.”

* * *

Olhando sem preconceito, a pedagogia escolástica medieval me parece bastante razoável. Aplicá-la ou adaptá-la aos dias de hoje são outros quinhentos. Se, de lá pra cá, até hoje se encontram desdobramentos e sistemas de ensino inspirados na escolástica, e em diferentes países, deve ser exatamente porque o encadeamento lógico da coisa toda cale lá dentro, faça sentido.

Ex-ducare: conduzir pra fora. Indo além, agora, seria preciso que fizéssemos a pergunta que pra mim é a raiz do problema: para que serve a educação, afinal?

A educação serve para o trabalho? Para a submissão, sublevação ou sublimação do espírito? É para aprender a pensar e descobrir coisas novas? É talvez para tudo isto junto e misturado, não podendo ser colocado da forma simplista como está aqui?

Fato é que, em praticamente qualquer talho que se tire da História, em qualquer época e qualquer lugar, sempre houve, por parte dos estratos sociais politicamente dominantes, a consciência de que era preciso restringir ao máximo a disseminação de conhecimento e circulação de ideias para que a massa de dominados não se insurgisse contra o status quo. As torneiras da educação, cultura, informação – todas as formas que a fluidez das ideias assume – são um poder estratégico que deve ser aberta ao povo aos pingos e aos poucos, de acordo com as circunstâncias. Assim foi, da pólis grega ao berço dos faraós, assim é, da Inglaterra recém-industrializada à mídia que hoje dissemina a idiotia e o consumismo embrulhadas em ilusões de arrivismo.

Então, hoje, para um filho, o que significaria uma educação de valor? Depende das premissas das quais partimos. Das inclinações pessoais do próprio indivíduo, acredito. E do subjetivo bom senso. Não tenho a resposta.

Mas veja aí o amigo minha inguinorança. Foi surpreendente reconhecer na fórmula medieval Trivium + Quadrivium um belo contraponto ao atual estado de coisas. E não adianta tentarmos nos enganar com maquiagens, converse você com qualquer professor do ensino público - e até do privado! – que você encontrará depoimentos aterrorizantes, apontando claramente para uma decadência generalizada - municipal, estadual, federal, global. Eis o perigo. Pois não defendem alguns que a formação deficiente dos cidadãos acarreta na formação de uma sociedade débil, corrompida e manipulável em todos os sentidos?

E vão combiná, né geeentem: não dá para levar muito a sério as estatísticas de educação propagandeadas pelos governos. Quase sempre são de natureza quantitativa – quantos entraram mais cedo na escola, quantos mais concluíram, quantos diminuíram a repetência – e quase nunca qualitativa – vide o grande contingente de analfabetos funcionais que deixam as instituições de ensino, grande parte sem saber ler, escrever ou fazer conta direito - e o mais grave - sem saber pensar.

Talvez, como disse Kant, tudo se resuma exatamente a isso, o dístico que poderia ostentar um lábaro do Iluminismo: *Ousar saber.

Ousar pensar.