terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Em 2009...


Rubem Braga


Meu ideal seria escrever uma história tão engraçada que aquela moça que está doente naquela casa cinzenta quando lesse minha história no jornal risse, risse tanto que chegasse a chorar e dissesse -- "ai meu Deus, que história mais engraçada!". E então a contasse para a cozinheira e telefonasse para duas ou três amigas para contar a história; e todos a quem ela contasse rissem muito e ficassem alegremente espantados de vê-la tão alegre. Ah, que minha história fosse como um raio de sol, irresistivelmente louro, quente, vivo, em sua vida de moça reclusa, enlutada, doente. Que ela mesma ficasse admirada ouvindo o próprio riso, e depois repetisse para si própria -- "mas essa história é mesmo muito engraçada!".

Que um casal que estivesse em casa mal-humorado, o marido bastante aborrecido com a mulher, a mulher bastante irritada com o marido, que esse casal também fosse atingido pela minha história. O marido a leria e começaria a rir, o que aumentaria a irritação da mulher. Mas depois que esta, apesar de sua má vontade, tomasse conhecimento da história, ela também risse muito, e ficassem os dois rindo sem poder olhar um para o outro sem rir mais; e que um, ouvindo aquele riso do outro, se lembrasse do alegre tempo de namoro, e reencontrassem os dois a alegria perdida de estarem juntos.

Que nas cadeias, nos hospitais, em todas as salas de espera a minha história chegasse -- e tão fascinante de graça, tão irresistível, tão colorida e tão pura que todos limpassem seu coração com lágrimas de alegria; que o comissário do distrito, depois de ler minha história, mandasse soltar aqueles bêbados e também aqueles pobres mulheres colhidas na calçada e lhes dissesse -- "por favor, se comportem, que diabo! Eu não gosto de prender ninguém!" . E que assim todos tratassem melhor seus empregados, seus dependentes e seus semelhantes em alegre e espontânea homenagem à minha história.

E que ela aos poucos se espalhasse pelo mundo e fosse contada de mil maneiras, e fosse atribuída a um persa, na Nigéria, a um australiano, em Dublin, a um japonês, em Chicago -- mas que em todas as línguas ela guardasse a sua frescura, a sua pureza, o seu encanto surpreendente; e que no fundo de uma aldeia da China, um chinês muito pobre, muito sábio e muito velho dissesse: "Nunca ouvi uma história assim tão engraçada e tão boa em toda a minha vida; valeu a pena ter vivido até hoje para ouvi-la; essa história não pode ter sido inventada por nenhum homem, foi com certeza algum anjo tagarela que a contou aos ouvidos de um santo que dormia, e que ele pensou que já estivesse morto; sim, deve ser uma história do céu que se filtrou por acaso até nosso conhecimento; é divina".

E quando todos me perguntassem -- "mas de onde é que você tirou essa história?" -- eu responderia que ela não é minha, que eu a ouvi por acaso na rua, de um desconhecido que a contava a outro desconhecido, e que por sinal começara a contar assim: "Ontem ouvi um sujeito contar uma história...".

E eu esconderia completamente a humilde verdade: que eu inventei toda a minha história em um só segundo, quando pensei na tristeza daquela moça que está doente, que sempre está doente e sempre está de luto e sozinha naquela pequena casa cinzenta de meu bairro.


Em 2009, meu ideal é que vocês estejam bem e em paz, construindo sempre. Beijo na bunda e até segunda. 

r

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Back to the future

Aproveitando o clima de última segunda-feira de 2008:  criaram a possibilidade de você mandar um e-mail para você mesmo, só que no futuro - http://www.futureme.org/. Tem gente já escrevendo as tradicionais resoluções de ano-novo agora para uma prestação de contas no reveillon de 2010.

Legal, a idéia. O seu "Eu" do passado vem assombrar o seu "Eu" do presente - no caso, seu "Eu" do futuro neste momento. 

Mas o que eu sempre sonhei mesmo, e imagino que não cavalgo sozinho nestes devaneios,  é poder voltar ao passado para encontrar minha versão mais jovem. Ah, quanto eu diria. Quanto eu não diria. Por exemplo:
- Não, você não vai virar jogador de futebol nem arqueólogo. 
- Você não vai atingir 1,80 m quando fizer 20 anos. 
- Larga mão de ser fresco, moleque: tu ainda vai se arrepender de cada oportunidade de perder a virgindade que deixou escapar. 
- Não faça CEFET. Ou faça, mas saiba que seu negócio não é engenharia.
- Procure um estágio em agência de propaganda o mais rápido possível, mesmo que você pague para trabalhar.
- Nada que vá mudar alguma coisa. Mas, a título de comentário, a decisão de torcer para o Atlético Mineiro foi uma péssima escolha.
- Não faça conversões proibidas, nem de madrugada, nem nunca. Ouviu? Isto é muito, muito importante.
- Ame sua família mais.
- Viaje e leia mais, seu preguiçoso. Saia do apartamento, tenha novas experiências. Não seja tão tímido, abrace a vida. 
- Não esquente, você vai ter várias namoradas. Mas, se você quiser adiantar as coisas, eu - se fosse você - começava a dar umas rondas no buteco da Biologia no ICB.
- Se estes conselhos forem inúteis e nada melhorar em sua vida, anote aí. Os números da mega-sena de 31/12/2008 são...
 

Livrarias, gozo e martírio

Chove sem parar lá fora e, cá dentro, da enxurrada de filmes vistos dos últimos dias, apenas um sobressai sem ressalvas: o brasileiro Estômago. Muito interessante, bem produzido, dirigido, interpretado. Coisa boa. Aliás, o filme nos deixou até uma sobremesa. Numa passagem, um dono de restaurante apresenta uma releitura do tradicional queijo com goiabada. Compramos os ingredientes para o reveillon, vamos experimentar.

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Chuva demais e frio pedem cama. Não somos ingleses.

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Ainda comida: improvisei um arroz com açafrão, legumes, tomates e outros temperinhos que mereceu repetecos no prato - o mais veemente dos elogios ao cozinheiro.

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Livros: fui ler o Arco-íris de Feynman, aquele físico famoso, e acabei emendando Contato, do Sagan, leitura do momento. Li O Enigma do Quatro, um tipo de Código da Vinci, só que mais bobinho e juvenil; o Aleph, do mestre argentino; O mundo é bárbaro, coletânea do Verissimo. Ando agora com um do Woody Allen, Às margens do Sena, um livro-entrevista com o Reali Jr, e tem mais uns tantos outros aí que me resta começar quanto terminar (registro mental: assim como elevar o nível das leituras). 

Já Meg é ortodoxa; dama que só ela, considera uma descortesia iniciar um livro sem dar cabo do atual. Gostaria de ter essa educação e auto-controle.

Auto-controle que certamente falta a ambos, quando se trata de sair incólume de qualquer livraria, sebo ou estabelecimento que venda livros. Não posso deixar a Dra. sem vigilância um só minutinho. Ontem, enquanto subi à casa de mãe para dar um abraço de boa viagem nela e nas irmãs, ela disse que ficaria a me esperar na locadora do lado. Foram uns dez minutinhos. Nesse intervalo, quando voltei, Meg já segurava um livro novinho: o Romanceiro da Inconfidência, da Cecília. Uma promoção irresistível, segundo ela, da locadora multiprodutos/serviços. Eu a censurei, chamei-a de esbanjadora, denunciei a compulsão perdulária e depois disparei: "- Vem cá! E que mais tinha em promoção?" 

Outro dia, foi sintomático. A fim de algum jogo interessante para adultos, visitamos lojas e lojas de brinquedos. Olhamos, olhamos, não compramos nada. A fim de presentear um ente querido, visitamos boutiques e boutiques. Olha vestido pra lá, olha preço pra cá, não compramos nada. Fomos ao cinema ver o que estava passando e, oh: a portinha da livraria está aberta! 

Nem foi preciso examinar muito. Uma olhadela e pronto, lá se vão alguns livros sem titubeio. Enquanto a gente ainda não pode gastar com livros totalmente sem dó e sem culpa, nosso consolo é a mútua indulgência. 










sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Sim, já fui damo de honra

Há 25 anos, no Serro, Ju minha irmã e eu de "damo" e dama de honra. Ela recebeu estas fotos recentemente. Foi descoberta no orkut pela senhorita que casou, vejam só. E aí nos fez a gentileza de enviar as fotos do dia do casamento nas quais aparecíamos.  

Hoje, imagino que qualquer moleque que vai ser damo entra na igreja de terninho; preto ou azul-marinho, bem-cortado, no tamanhinho certo. 


Ah, mas com o papai aqui sempre é diferente. Ou aquelas épocas eram outras ou (o que acredito) minha mãe tinha, digamos assim, um habitual "toque unissex" na gloriosa tarefa de criar o figurino do filhote para as mais diversas socialidades. Senão, como explicar a meia-calça(!), a delicadeza do sapatinho branco, a fofice das luvas (!) e, no pescoço, um gigantesco laço róseo (!) como gravata?

Parei.


terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Boêmios contra-atacam

Esqueci de mencionar que, semana passada, Leo e eu, integrantes originais do grupo, e nosso mais novo e bem-vindo membro, a Doutora, reeditamos a legenda Boêmios na noite de BH.

Inventado por Leo, Boêmios no Divã era o nome que dávamos à fauna que se reunia, nas segundas e quintas, em gincanas culturais no extinto Amoricana e no teutônico Canapé. Nunca houve uma equipe definida, a mesa era aberta a quem quisesse sentar. Os fixos, até mais do que eu, talvez, eram Bruno, Érico, Rodrigão, Titio. Outras pessoas, como Sâmia, Danilo, Formigão eram intermitentes. Boêmios no Divã ficamos conhecidos nos bares da cidade porque quase sempre abiscoitávamos algum prêmio, alguma boa colocação, quando não o primeiro lugar. 

Lembro que invariavelmente perdíamos para uma mesa de senhores de cabelos brancos no Amoricana: um era arquiteto; outro, advogado; outro, engenheiro, por aí vai. E tinha um grupo numeroso chamado os Persistentes, uma turminha mais nova que disputava pau a pau com a gente. 

Bem, não há mais um Bruno de ligação entre as tribos, os elos da turma praticamente se desfizeram e, eventualmente, abandonamos a prática da gincana cultural, embora já tenhamos realizado uma festa só com as caixas de vinhos e cervejas amealhados nessas brincadeiras.

Na quinta-feira passada, quando o Pacote, locutor/organizador da gincana do Canapé, viu surpreso o nome escrito na cartelinha, indicando que a nossa mesa teve uma das maiores pontuações na primeira rodada de perguntas, disse, numa solenidade sem-graça: "Boêmios no Divã. A volta dos que não foram".

Mas nós fomos, Pacote. Fomos, sim. Não sem antes papar duas caixas de Brahma. 
  


Esvazie suas gavetas

Sim, esvazie suas gavetas. Há canetas que não escrevem mais e suas tampinhas divorciadas lá no fundo; anotações avulsas em papéis esquecidos que, se um dia significaram alguma coisa importante, hoje são apenas letras e numerais; araminhos de amarrar saco de pão ainda têm azo, embora a abundância com que freqüentarão o seu dia-a-dia enseja-lhes o despejo; comprovantes coloridos atestam que houve uma madrugada em que você esteve em débito com o banco mas em crédito com a vida; esvazie tudo.

Alivie seu e-mail box. Use critério na sentença derradeira de seus e-mails, julgue se não vá precisar deles depois de enviá-los ao ciberlimbo. Tudo o que for prescrito deve ser proscrito.

Descarte sapatos velhos. Eles, que vigiaram os erros e acertos dos seus passos e sofreram o suor e a imundície na jornada da sua labuta, merecem aposentadoria. Ou talvez começar vida nova em um caminhar mais árduo do que o seu.

Doe roupas. Repare que elas são perecíveis como os alimentos, mas diferentes em validade: há calças intocadas e camisetas fresquinhas que já entram no seu guarda-roupa com o prazo vencido , embora ombro a ombro com farrapos de jeans e panos vetustos, mas que ainda se encontram consumíveis e em plena forma. Dê o que não goste, dê o que goste se a roupa querida já deu para o gasto; esteja prevenido: não há garantia de sorrisos se você alcança na memória longínqua o sabor de uma mancha ou a origem de uma descostura.

Desapego é mistério; relutância ao abandono até do que não foi jubiloso. A trilha adiante é mais leve sem toda essa tralha, e quem raciocina um pouco mais percebe que não é preciso uma efeméride de calendário para se livrar do que ocupa o desnecessário no embornal das horas. Que a convenção de um relógio compartilhado pode ser útil como lembrete do dia de faxina. 

Ou, pura e tão-somente, como despertador. 

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Círio de Infortúnios

A luz que não acende

O chuveiro que se queima

O prêmio que não se ganha

O computador que dá pau

O professor que cobra o prazo

O trabalho que ainda não se fez

O carro estacionado que prende o meu

O alarme predial que dispara

A nova multa que chega

O condomínio que não se pagou

A carne que deteriora na geladeira

A carne que deteriora no corpo

O cabelo que já não é o de outrora

O dinheiro que não sobra pra nada

A cozinha que não se limpa

O outro chuveiro que desliga sozinho

A poeira que não se move

Os crápulas bastardos que movem processos

Os presentes que não se comprou

O telefone que não funciona em casa

O número que dizem inexistente

A chamada que era engano

O idiota que anda devagar

As noites que não se dorme

As decepções que se causa

As decisões que se adia

A memória que desmorona

As amizades que ruem

O tempo que escasseia

A vida que escorre

A luz que se apaga

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

It's raining again

Daqui a pouco, estaremos como Santa Catarina. Tem cidade mineira que está se transformando numa espécie de Veneza de barro. Aliás, hedionda aquela história dos milicos surrupiando os donativos para os desabrigados, não? 

Como se fosse ironia de menos, logo depois veio a notícia de que uma das vítimas das enchentes devolveu 20 mil pratas encontradas no bolso de um casaco doado. Mais não sei porque não li. Mas, na boa: nessas circunstâncias, será que eu devolveria?

Desabamento em encostas, flagelo nas áreas de risco, etc. O curioso é a falta de novidade. Todo ano é a mesma coisa, a mesma incúria por parte - por parte de quem mesmo? Certamente que a ausência de condições mínimas de infra-estrutura urbana, sanitária e habitacional recai sobre os ombros das autoridades públicas responsáveis. Afinal, como todo mundo sabe, no Brasil a gente paga imposto é pra isso. Mas será que certas tragédias ainda assim poderiam ser evitadas?Esses dias, um trecho da moderníssima Linha Verde, obra viária recém-incluída e tão cara ao nosso governador, virou um riacho. Mesmo com uma eventual e possível falha no conjunto urbanístico local ou na execução do empreendimento, e quando chegar o dia em que a natureza resolver embirrar de verdade? A cada verão tentamos mitigar os efeitos das chuvas em detrimento da prevenção. Mas teríamos condições de realmente nos precaver? 

Calcemos nossas galochas. 

Reflexões no chuveiro

A despeito da sólida confiança na virtude da metodologia e pensamento científicos, me sugere imprudência acreditar que a realidade é tudo o que nossa percepção é capaz de abarcar.

Em vez de montar sentinela nas fronteiras da presunção, seria mais interessante admitir, com segurança, os limites de todo o conhecimento cartografado pelo rigor da ciência para, a partir deste ponto, tendo em perspectiva até onde vão as bandeiras da nossa razão e cultura, podermos com clareza distinguir quando começa a geografia de nossa ignorância. E considerar, talvez, a existência de territórios inexplorados nessa vastidão que chamamos de realidade.

Ficou meio pernóstico, mas vai ficar assim.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Passatempo pelo espaço

Há! Viciante. Vi na Mary W, que recebeu a dica da mothern Ju Sampaio.

Aqui, cumpadi. Tu é bom mesmo em geografia? Tu tá a fim de colocar tua bagagem cultural à prova? Tu manja messsssmo onde fica o Butão e o Azerbaijão? Então arruma os pano de bunda e se manda, mané! Entre no link e viaje ligeiro!

Cantando na chuva

Aproveitando o clima, turma de BH. Mas uma releitura moderna - e publicitária, of course.

Dica do colega Matheus

Sua biografia de 6 palavras

Meninas, aderi!!!

Aos memes, digo.

Dizem que Hemingway foi seduzido pelo desafio de criar uma história em apenas seis palavras. Saiu-se com “Vendo sapatos de bebê. Nunca utilizados”. A partir desta idéia, os editores de uma revista sobre literatura, a Smith, bolaram uma proposta semelhante: convidaram escritores e que tais a fazer a própria biografia em seis palavras. Com o resultado, reuniram os melhores resumos em um lançamento intitulado Not Quite I Was Planning.

Para a honra e a glória do seu anonimato, estendo a você o convite de deixar aqui no Boêmios no Divã a história da sua vida em seis palavras. Ou, se preferir (hunf!), você pode acessar o site da revista e, quem sabe, ter a sua frase escolhida para o próximo lançamento dos editores - mas lá tem que ser em ingrêis. Já neste blog, aceito até a língua do P.

Alguns exemplos:
- Wait, wait, I'm not done yet.
- The truth: butter makes everything better.
- Sticky rice everyday; not shit.
- Have the greatest job: being dad.
- Where is that damned time machine?

Claro, nem todas são bem-humoradas. Há as tristes, melancólicas e declarativas. Quer tentar?

PS. Esqueci de deixar a minha biografia em 6 palavras:
-" Deu merda: mas não fui eu!".

Mesas

Algumas mesas caberiam fácil na minha sala. E na sua?

The bloody table.

Image: via John Nouanesing)


As mesas dançarina, andante e centopéica.




(Images: via design boom and Anyroom)

A mesa "This is... SPARTA!!!".



(Images: via Julia West Home and James McAdam)



A mesa piano-bar. Com a minha geladeira de 60 anos, ia ficar show.

(Image: via lovegrove and repucci)


Tudo daqui. Tem muita coisa legal lá: mais mesas, pias, cômodas. Go.

Movimento Sapatista

Seguindo a linha de raciocínio do blog do Juca, diga: Em quem você atiraria um sapato?

Sou BHTrans e dou dez pares de frente.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Prazer inenarrável

Hoje de manhã aconteceu uma coisa maravilhosa. Fui para o trabalho, chovia sem parar. Estacionei; parei o carro, rádio ligado; a canção que estava tocando terminara; aí ouvi "Tchu-rururuuu, Tchu-rururuuu" e, justo quando Jorge Vercillo ia começar a cantar Nada vai me fazer desistir do amor, desliguei.

Ah, a vida é boa.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

De sola

A saída do Bush vai ganhando contornos de bota-fora. Na coletiva à imprensa no Iraque, em vez de palmas, palmilhas. Se é verdade que só a gente sabe onde o calo dói, quem há de julgar a atitude do jornalista? É possível um anúncio de oportunidade com a sapatada no presidente? Quem seria anunciante? Dr. Scholls?

E se a moda pega? No Brasil, que calçado arremessariam no Lula? Salto alto?

Tá, parei.

Aliás

É pena que Borges não tenha nos deixado mais de si próprio, digo, algo confessional. Eu não soubera expressar isso à Dra., quando li, para minha delícia e espanto, certas páginas que abrem ou fecham seus livros. Encantado pela serpenteante habilidade narrativa de um mero prefácio ou epílogo borgiano, veio-me a nítida certeza de que seus escritos "pessoais" seriam tão arrebatadores quanto a ficção. A tradução deste palpite encontrei hoje numa declaração do próprio autor: "Não criei personagens. Tudo o que escrevo é autobiográfico. Porém, não expresso minhas emoções diretamente, mas por meio de fábulas e símbolos. Nunca fiz confissões. Mas cada página que escrevi teve origem em minha emoção".
Uma pena. E que pena.

Jorge e Marcel

Na cama, o casal lê livros.

- Coisa, não?
- O quê?
- Você, de Proust. Eu, com Borges.
- Tá vendo? A gente na cama com Proust e Borges. Não é pra qualquer um.
- Tem razão. Deve ser uma honra pra eles, né?

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Sono meu, vai levar quem...

Nas últimas 72 horas, ando extraordinariamente com sono; por derivação, com uma indisposição considerável e halterofilizando pálpebras de chumbo pra manter a vigília, que dirá pra palavrear livremente, a passeio. Ahhh, uma folga neste fim de ano vinha a calhar, só alguns sóis sem labuta, uns 265 ou 238 dias corridos. Falar em liberdade, lembrei-me de um trechinho da entrevista que li agora do Millor na Bravo, ele citando uma de suas frases ótimas. Millor, eu também quero ser livre como um táxi. E ó, se for pra carregar pedra, rodar só de bandeira 2.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Dois peixes

Gracias, Mr. Eisner.


Dois peixinhos dourados viviam em um aquário. Entediado, um disse pro outro:

- Não acredito em um deus. Não existe essa história de um ser supremo, divindade máxima, onipotente, com consciência infinita.

Silêncio no aquário. Até que o outro responde:

- Ah, não? E QUEM você acha que nos dá comida todos os dias?

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Ciências contábeis

Ser credor é osso. Quem lida com publicidade, sabe. Seja por vias oficiais ou no paralelo, receber o quinhão que lhe compete às veiz dá mais trabalho que o próprio job. Se bem que isso deve ser comum noutras áreas, como comércio, etc. Ao fim, uma dúvida me colhe: é melhor ser credor ou devedor?

No aspecto monetário, sei não. Depende das possibilidades. Se houver a esperança implícita de indulto ao inadimplente, ou de existirem grandes chances de receber o que lhe é devido, mesmo que leve um tempinho.

E no campo amoroso? Sei não. Acho que aqui é ruim de qualquer jeito, todos parecem sair perdendo. Dever me parece tão lamentável quanto cobrar. Se amar implicasse anotar débitos numa caderneta, que fossem registrados a lápis, com data de vencimento na margem e uma borracha sempre à mão.

Amar deve ser perdoar dívidas - se você for cobrador. Se, por outro lado, seu saldo viver no vermelho, deve-se trabalhar com o máximo esforço para retribuir o crédito dia a dia concedido. É difícil, mas imagino que deve ser assim: quem dá calote sentimental acaba pagando de qualquer jeito, com juros e correção.

Desconfio que, numa relação, o amor pode até funcionar um tempo fiado. Mas, seja a oferta à vista ou a prazo, amor, amor mesmo, nunca, nunca se vende.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Para Meg

O espetacular Homem-Hamster


Depois da mordida que levei de um hamster, estou com diarréia há dois dias, tive uma crise incrível de espirros agora há pouco e ando meio sonolento. Pode ser tudo coincidência: teve a cervejinha do fim de semana, as poucas horas de sono, as mudanças do tempo. Mas...


Se ao menos o pestinha fosse radioativo.

Error



Para melhorar seu apelo junto aos jovens e se posicionar como uma empresa cool, a Microsoft lançou uma grife: “Softwear by Microsoft”. As estampas remetem aos anos 80, com inscrições DOS, Microsoft ou a repetição do código binário.



Pela amostra, acho que foi um tiro no pé. Ou alguém aí tem peito de usar?


From site da Epocanegócios.


Melhor seria se bolassem uma camiseta assim:


Atualizado pela contribuição do amigo. Valeu, Leo.

A terapeuta matinal

Terminei de ler um livro do Dr. Irvin D. Yalom, o autor de Quando Nietzsche chorou, talvez seu lançamento mais famoso. O que eu li - O carrasco do amor - já havia, como era de se esperar, sido devorado por Meg faz tempo. Ela já leu quase todos.

É leitura muito interessante, quase viciante. Divido em contos, cada capítulo conta a história mezzo real mezzo calabresa de um determinado paciente. Fica difícil largar o conto, a gente parece ter algum sentimento meio mórbido de acompanhar a paranóia do outro, a forma como aquele paciente conseguiu aliviar ou erradicar as próprias neuroses, que, não raro, costumam, aqui e ali, ser muito semelhantes às que tentamos ou fingimos ocultar.

Agora, creio ter uma compreensão melhor das razões pelas quais, nas preguiçosas manhãs dos primeiros meses do namoro com a Dra., ela sempre me perguntava o que eu havia sonhado. Intrigado, eu pensava: "Mas que diabos essa mulher tá tão preocupada com o que ando sonhando?". Mas eu sempre contava o sonho, pelo menos o que lembrava, e então, enquanto sorvia a sua xícara de café fumegante, Meg se dedicava a dissecar meu sonho por meio de complexas psicoteorias do inconsciente, sistematizações lacanianas e análises freudianas, diante do meu silêncio desconfiado ou de uma ou outra aquiescência. Como dizia, esse comportamento da minha terapeuta matinal me parece claro agora, depois de ter lido o Dr. Yalom. Em seus tratamentos, ele dá muita importância aos significados dos sonhos dos pacientes. Hoje, virou quase um hábito entre os dois charlatães acordar e querer saber sonho do outro para bancar o terapeuta agudo e persipcaz .

Mas vou ler mais. Nas artes da boemia sou versado, tenho que ficar prosa é no divã.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

pedra leticia

Assim como a mocinha que o Marcelo Camelo tá pegando, parece que sou o último a saber da banda goiana Pedra Letícia. É bobo, brega e calculadamente desprentensioso, e parece que tá bombando na web, entre os adolescentes, imagino. Os caras até que tem umas musicas divertidinhas. E cada década tem seu Ultraje a Rigor que merece.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Oxímoro

No texto do post anterior, que repliquei do blog do Noblat (ando pegando muitas coisas de lá; embora não tantas quanto gostaria, como a tal Estação Jazz e Tal, coisa boa, vocês têm que ouvir), o Luiz Fernando cita, entre parênteses, a figura de linguagem oxímoro (prefiro com o acento agudo, mas parece que é facultativo).

Há coisa de dois anos, eu desconhecia o significado dessa figura de linguagem. Ou seria de estilo? Peraí que vou dar uma googlada e volto.

Figura de linguagem. O oxímoro é uma molecagem semântica: mistura dois sentidos interpretativamente opostos, produzindo uma mensagem que deve margear o absurdo.

Minha relação com as figuras de linguagem ou de estilo é assim-assim. Eu nunca me importei muito em saber ou decorar qual é qual. Desde que sejam bois, imagino que a relevância de lhe saber os nomes seja relativa para o criador de letras. A noção do nome de cada figura seria apenas um detalhe, o importante é o prazer que proporcionam. Seria até uma relação meio riquinho-esnobe-que-só-veste-o-fino-das-marcas, mas finge não ligar pra isso:

- "Isso pendurado na sua frase é um Epizêuxis? Luxo!"

Blasé, você responde:

-"Mesmo? Nem tinha notado."

Como dizia, há dois anos eu desconhecia o termo oxímoro e seu significado, que soava mais como um primo do oxíuro do que um recurso literário. Fui topar com a figura em uma revista em quadrinhos, numa historinha dos X-men.

Não sei bem por quê estou dizendo tudo isso. Talvez para mostrar que quadrinhos e cultura (nem que seja a inútil) não sejam, digamos, um oxímoro.

Monte Rushmore

Símbolos
Luiz Fernando Verissimo

Ninguém ainda disse que nas origens dessa crise, além da ganância descontrolada e das maracutaias de alto escalão, há um toque de generosidade. Tudo começou porque deram empréstimos imobiliários a quem não podia pagar, aos tais clientes "sub-prime" cujo calote era certo. Não foi o bom coração dos banqueiros (um oximoro) que decretou que mau pagador também merecia crédito e que caloteiro também merecia casa. Suas dívidas eram transformadas em títulos negociados em cadeia no grande troca-troca que sustentava o mercado de mentira, e tanto fazia os devedores serem "prime" ou "sub-prime", de alto ou de baixo risco, o lucro das financeiras se multiplicava. Mas até a bolha arrebentar, mau pagador foi tratado sem preconceito, caloteiro não foi discriminado e tivemos um inspirador exemplo de capitalismo popular em ação.
O Baraca tanto prometeu mudanças que acabou decepcionando boa parte dos seus eleitores antes mesmo de começar. Novos presidentes costumam ter uma lua-de-mel com o país nos primeiro dias do seu governo, um período de tolerância ou de amor sem perguntas enquanto toma pé ou acerta a mão. Muita gente pergunta para que tipo de lua-de-mel o Baraca está convidando o país, com Lawrence Summers e o velho Paul Volcker pensando em maneiras novas de fazer o que já fizeram, e Hillary Clinton, que apoiou a invasão do Iraque, e Robert Gates, que como secretário da Defesa do Bush a comanda, combinando como agora vão ser contra, e todos na mesma cama. Obama, mais do que ninguém, deve saber que o valor simbólico de gestos e nomes muitas vezes é mais importante do que o fato. A própria eleição de um negro para a presidência dos Estados Unidos tem um significado simbólico que se sobrepões a qualquer outro, e será sempre maior do que qualquer fato do Baraca, mesmo seu centrismo decepcionante. Mas seu gabinete anunciado não simboliza as mudanças prometidas, simboliza a mesma coisa. Em alguns casos com a mesma cara.
A gente vive atrás de símbolos, e os mais procurados são os que marcam, convenientemente, o fim ou o começo de períodos históricos. Gostamos de frases sintéticas tipo "o século dezenove acabou mesmo com o naufrágio do Titanic" ou "a revoluçção sexual começou com a bunda de fora da Brigitte Bardot'. A Ford está entre as montadoras americanas que nesta semana foram pedir ajuda ao Congresso americano para não naufragarem, e se há um fato que simbolizaria o fim de várias eras, idades, ciclos e mundos seria o anúncio do fim da Ford.
Foi a Ford - ou no caso o Ford, Henry, grande visionário, grande patife - que inventou a civilização em que vivemos, o carro massificado, o ar envenenado, a linha de montagem desumanizada, o operário consumidor, um verdadeiro capitalismo popular e um proletariado em grande parte politicamente neutralizado. E mudou a face da terra. Cair a Ford seria, sei lá, como cair o nariz de um daqueles rostos de presidentes americanos esculpidos na rocha.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Reflexões sem frutos

Tem gente que passa o tempo ganhando dinheiro. E tem gente que escreve blogs.

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Esc rever é c ort ar pala s.

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Pode ser estranho, mas só fui comer jambo antionti - três décadas e tantos anos após a estréia. Jambo é branquinho por dentro, e doce; por fora, um tom mais roxeado, e não bronze, como pensara que fosse, por causa da expressão "moreno jambo". Não entendi por que pai falou que, comendo o jambo, nem se precisaria escovar os dentes. Galhofa dele, porque aquilo podia ter o gosto de qualquer coisa, arrisquei, até de jambo, mas de dentifrício, não. Sem a certeza de caminhar com o hálito puro e refrescante, preferi não perguntar nada.

Pensando bem, há muita fruta que a gente não come, só ouve falar. Fruta-pão, por exemplo. Nunca carquei os dentes. Nem tamarindo, umbu ou cupuaçu. Sirigüela, já comi. As mais comuns, todas. Mas algumas, só em sorvete, como a cagaita, ou suco, como graviola (uma delícia em tempo de calor, batida com cubos de gelo no liqüi).

Cajá, encaro. Já jaca, tô fora.

Enfim, nada com nada. É o verão.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Bar do Rubão

Ontem, saí de casa às oito e cinco. Não queria me atrasar. Primeiro, fui ao posto de gasolina. Depois, passei na casa de mãe para pegar a sacola de remédios de pai. Foi rapidinho. Não queria me atrasar, a terça-feira seria dia cheio e, embora a esta hora o trânsito pudesse estar mais tranqüilo na Cristiano Machado, levaria uns 40 minutos para chegar a Lagoa Santa.

No caminho, olhei de soslaio para a sacola de remédios e pensei nela com alguma tristeza. Senti que talvez nunca a tenha dado a atenção devida, ou reparado naquele punhado de comprimidos como fato que merecesse pelo menos um mínimo de reflexão. Eram muitas caixas de comprimidos. Caro barbaridade. E, sei lá, é um remédio pra deixar o sangue ralinho, outro pra colesterol alto, outro pra não sei o quê... me imaginei dependente da ingestão diária de tantas pílulas. Como seria meu humor? Ficaria deprimido? Cardiopatas de colesterol alto são casos comuns na família.

Pai tem passado os dias-feiras em Lagoa Santa para acompanhar a reforma da sua velha nova grande casa. Alugado por dez anos, acho, o imóvel fora devolvido em péssimo estado. Considerável parte se deteriorara: jardins abandonados, portas e maçanetas quebradas, pontos de luz, móveis e paredes negligenciadas; edificações posteriores equivocadas ou de mau gosto; um descuido em cada detalhe.

Então, bem, pai estava juntando seus caraminguás com a esposa para reconduzir aquela residência aos seus dias de glória. E é uma bela casa: gramado frontal, árvores frutíferas aqui e ali; campinho, piscina, casinha de bonecas e plantas em um terreno quase perdulário em seu espaço. Aproveitando o ensejo, ele ia mudar certas coisas e acrescentar peculiaridades ao seu gosto: a construção de aposentos do lado de fora da casa principal; a derrubada da casa do caseiro, agora garagem; a adição de um closet e uma horta, e o deslocamento da área da churrasqueira, que não podia mais ser chamada tão-somente de área da churrasqueira. "Espaço Country Gourmet" é sacanagem; creio que nem pai nem eu apreciamos esses frescurismos, a não ser com intuito de molecagem, mas a expressão teria lá sua utilidade como efeito de descrição do espaço.

Esse espaço, praticamente um anexo à cozinha da casa principal, já estava em obra adiantada. Tinha bancos e mesa de madeira, dessas compridas, de roça; a churrasqueira de tijolinho aparente, já instalada, com chaminé e tudo atravessando as telhas; no canto oposto, na parede do banheirinho, uma pia de tigela de cerâmica (que antes servia a um vaso de planta, mas agora estava envernizada e com buraquinho pro ralo) sobre um aparador com pernas de madeira e tampo de mármore - tudo invenções e adaptações de pai, sua inquietude e suas caixas de ferramentas; um charmoso fogão a lenha de madeira e pedra-sabão, modelo semi-pronto que veio do Serro, tipo exportação. Tudo isso vi ontem à noite. Aí, na bancada contígua à churrasqueira e à frente do fogão, havia um barrilete de madeira sobre cavaletes - isso tem um outro nome, sempre esqueço - em cuja fronte se lia a inscrição em vermelho, tipo manuscrito: "Bar do Rubão".

Era significativo. No meio daquela confusão de materiais de construção, sacos de cimento, tijolos, pedreiros, ajudantes, uma peça que, cronicamente, estava fora de seu lugar.

Compreendi que era uma pequena, grande porém, homenagem.

O bicho ainda disse que seria ótimo se conseguisse no mercado paralelo uma daquelas caras bicas de tirar chope para instalar ali - seja funcionando perfeitamente, seja como ornamento.

Apesar de honradíssimo, profundamente agradecido e algo embaraçado, julgo que seria temerário confiar a um boêmio de escol a direção de qualquer boteco, e, desta forma, penso no bem comum ao declinar de possíveis convites para quaisquer formas de comando ou gerência do Bar do Rubão.

Mas, senhores - a questão é que em breve teremos um charmoso barzinho, em Lagoa Santa, com ingresso para poucos, seletos e exclusivíssimos convidados. Vamos tratar de merecê-lo - a começar por mim.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Terrorista

Taí a picture de um dos genocidas que protagonizaram o ataque na Índia. Nada de panos e vestes muçulmanos, nada de turbante na cabeça nem barba de aiatolá. Nada de especial. Exceto pela metralhadora em punho, o tipo de sujeito que se tromba nas esquinas do centro da cidade todos os dias.

Espero que dê samba

De tudo importante e desimportante que sucedeu no acorde dos últimos dias, uma nota destoa das demais. Há um casal amigo que está tentando engravidar. Boa sorte a eles.