Watchmen foi quase tudo o que eu esperava: ou seja, quase nada.
A verdade é que esse negócio de adaptar obras de quadrinhos para o cinema exige que o leitor se desprenda de qualquer expectativa - é totalmente outra história que se passa na telona; leve-se em conta, como no telefone sem fio, que é a visão de um terceiro; e sobretudo há as diferenças intrínsecas entre as duas mídias, o que dificulta ainda mais quando a história original foi exclusivamente concebida para um meio audiovisual que apresenta vantagens e desvantagens em relação ao cinema.
Acho que adaptar literatura é mais fácil.
Ressalva feita, ora, dá pra encarar numa boa qualquer projeção "...baseada na aclamada obra XYZ", se se entende que nada mais é do que exatamente isso: uma adaptação; uma leitura interpretada a partir de uma idéia primeva; uma receita de churrasco em um microondas.
Nerds talvez se empolguem com o filme. Mas críticos que não conhecem a fundo a graphic novel, como por exemplo a Isabela Boscov, dizem que o filme não funciona - e acho que têm razão. O grande público deve sentir o mesmo estranhamento, e tanto isso deve ser verdade que, pelo menos por aqui, o filme já está minguando nos horários dos cinemas, apesar do pouco tempo de exibição, menos de um mês.
Quem admira a obra do Alan Moore provavelmente ficou desconfortável com as cenas de violência gratuitas/explícitas e aquelas lutinhas coreografadas (totalmente desnecessárias e que me deram vergonha alheia, nas quais nem um mísero meliante consegue acertar um cuspe à distância no mocinho) que absolutamente não existiam ou foram deturpadas do original.
A ausência do lado humano da história, dos dilemas e contradições morais, dos dramas paralelos - tudo só confirmou a suspeita de que sensibilidade não é lá o forte do Zack Snyder (desconfio que seria melhor produtor do que diretor). E que a pressão dos figurões de Hollywood, a necessidade de correr com o tempo num filme já longo para os atuais padrões e a idéia de reproduzir na película uma história intrincada como Watchmen só prova que foi uma tentativa, embora acredite bem intencionada, vã desde o início.
Ainda bem que fui sem Meg. Se ainda alimento esperanças de que um dia ela leia a obra-prima em quadrinhos, conhecer a história por meio do filme seria prestar um desserviço.
Pelo menos nesse ponto tô com o Rorschach: sem acordo, sem concessões. Nem à beira do Armageddon.
4 comentários:
Vim parar aqui quase por acaso (graças ao Copy&Paste) e vou deixar o meu pitaco -
tudo bem que o filme não funciona - não aprofunda ( e era impossível superar a rede montada pela HQ) - tudo bem que sacanearam o final e meio que baratearam o troço todo) -
e que o ator para Ozymandias foi total miscast - e odiei ele apanhar no final, quando Veidt no gibi é líquido e certo...
MAS,
falando no encaixe da trilha,
o trecho inicial (com Times are a-changing); o trecho do Dr. Manhattan (com Philip Glass) e (especialmente) a chegada dos "two riders aproaching" no arqui (com All along the watchtower) valeram de sobra o ingresso -
uma puta sacanagem foi não aproveitarem a Billie Holiday e o Iggy Pop explícitos no gibi - estavam ali, potz, era só pegar...
E as cenas de luta realmente são algo constrangedoras, quando uma das ideias fundamentais é mostrar que os mascarados têm carne e osso...
Ivan, concordo com tudo, exceto que três ou quarto acertos de trilha valem de sobra o ingresso.
Rapaz, é contentar-se com pouco demais!
Enfim, agradeço o pitaco. Volte sempre, a casa é sua.
r
PS
A ausência de You´re my thrill foi brochante! Com trocadalho! ("Aleluia?!?" Piada dentro da piada, não?)
Então tá: pra justificar meu comentário - fui numa terça num cinema em que era meia-entrada especial e paguei cinco mangos -
e acrescento que o desempenho do cara que fez o Rorschach levaria 3 dos 5 mangos...
Touché. Já eu daria os teus três mangos para a fantasia da Silk Specter e ainda sobravam dois pra um Chicabon.
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